A arte como motivadora da busca pelo saber e pelo conhecimento, num momento ímpar da civilização ocidental, onde as condições materiais, sociais e políticas permitiram um florescimento artístico poucas vezes visto na história. Tal renovação cultural abriu um leque de possibilidades e realizações nas artes de modo geral, como também nas ciências, a ponto dos europeus poderem se equiparar ao Islão (muçulmanos) em termos de civilização. A Itália foi o grande centro irradiador desse processo que influenciou a Europa no início da Era Moderna. Exatamente nesse momento viveu um personagem, que teve a sua vida voltada para a criação artística e, através dela, realizou importantes investigações a respeito do homem e da natureza: Leonardo da Vinci (1452-1519). As suas obras como pintor são apenas a face mais visível de seu talento e pioneirismo em vários ramos do conhecimento. Neste ano lembramos os cinco séculos de seu desaparecimento e com isso a oportunidade para vislumbrar a figura que melhor representou o chamado Renascimento Cultural. Para muitos estudiosos, Leonardo da Vinci (na imagem acima, detalhe de um possível autorretrato) foi o personagem-síntese dessa época.
A Itália da Renascença tinha uma configuração política diferente do que é hoje, sendo o seu território formado por um conjunto de estados independentes (para lembrar, a unificação só veio em 1870), cujo núcleo eram as cidades que adquiriram destaque econômico e político nos últimos séculos da Idade Média. Em certos períodos, alguns desses pequenos estados se sobressaiam sobre os demais, como Siena, Milão, Veneza e Florença (a Firenze dos italianos). Além desses, ainda existiam os territórios pertencentes aos Estados Papais, incluindo a cidade de Roma, governados pela Igreja Católica, cuja autoridade máxima era o papa e ao sul, o Reino de Nápoles e da Sicília. A península italiana desfrutava de uma vantagem geográfica, por estar situada entre a Europa central e o Oriente, no cruzamento de rotas comerciais que traziam produtos como as especiarias (temperos), a seda, a porcelana e os tapetes, todos provenientes da Ásia. Esse dinamismo econômico permitiu o surgimento de uma vigorosa classe mercantil, também ligada às manufaturas (principalmente de tecidos) e à atividade financeira (bancos), o chamado popolo grasso ("homens gordos") que constituirá a burguesia. Alguns, em busca de prestígio, misturaram-se com a antiga aristocracia de origem feudal, a ponto de ser difícil distinguir a pureza de sangue da riqueza recém adquirida no comércio. Muitas dessas famílias acabaram alcançando enorme influência política, como os Baglioni em Perúgia, os Bentivoglio em Bolonha e os Médici em Florença.
Em função das suas atividades, esses clãs familiares viviam nas cidades, onde a busca por prestígio social levou-os a um envolvimento maior com o cotidiano urbano, patrocinando festividades, jogos, espetáculos públicos e obras arquitetônicas (na imagem acima, o palio ou corrida de cavalos, realizada até hoje na cidade de Siena). Daí o fato de se cercarem de artistas, arquitetos, poetas, músicos, escultores e pintores, protegendo e empregando esses profissionais. Sem esses patrocinadores, chamados de mecenas, a arte do Renascimento não teria se concretizado.
Como destaca o historiador Nicolau Sevcenko em seu livro "O Renascimento" (Atual Editora, 1994) esse momento histórico estimulou a inventividade, a observação atenta da natureza e os experimentos, base daquilo que veio a se chamar de ciência. Surgem novas técnicas de exploração na agricultura, na metalurgia, na construção naval, na navegação (bússola, astrolábio, cartografia) e na arte da guerra (uso da pólvora, canhões).
Entre os comerciantes e financistas começaram a ser adotadas práticas que se tornaram normais no capitalismo: acordos de sociedade; seguros marítimos; transferência de crédito e a aplicação da noção de ativo e passivo na contabilidade das firmas (na imagem acima, um livro de matemática para comerciantes tendo no lado direito uma tabela de câmbio de conversão para moedas florentinas). Além de tudo isso, tivemos o aparecimento da imprensa (tipografia) fazendo com que os livros atingissem maior número de leitores. Por incrível que possa parecer, os indivíduos associados diretamente a essas mudanças vislumbravam o passado e não o futuro. A Antiguidade Clássica (civilizações grega e romana) começou a ser revivida por meio de intelectuais conhecidos como humanistas. O interesse pelos antigos escritores, historiadores, poetas e artistas foi despertado a tal ponto, que se convencionou dizer a respeito do fim de uma "idade das trevas" e o renascer da civilização, daí o termo Renascença. A noção de que a Idade Média representava a "escuridão", embora enganosa, surgiu a partir dessa ideia.
Os anos de 1300 (Trecento) marcaram o início dessa renovação cultural, sendo a época do poeta Dante Alighieri, dos pintores Giotto e Masaccio. Contudo, em 1348, a Itália (como também a Europa) foi abalada pela Peste Negra (ou peste bubônica) que dizimou algo em torno da terça parte da população do continente. Em função do dinamismo da economia italiana, a recuperação lá foi mais rápida.
No final do Trecento é que tivemos a ascensão de Florença (na gravura acima a cidade, cortada pelo rio Arno, em 1480), na região da Toscana (noroeste da Itália) com sua atividade mercantil e sua manufatura têxtil (lã). A mesma tinha um ambiente propício para o desenvolvimento das artes, pois era uma cidade rica, tinha moeda forte (o florim) e contava com uma universidade. Na época em que Leonardo lá chegou, a sua população girava em torno dos 40 mil habitantes e um terço dela era alfabetizada, algo inédito naqueles tempos. Aproximadamente uma centena de famílias muito ricas viviam em Florença. Entre 1450 e 1470 pelo menos trinta palacetes foram erguidos na cidade, o que requisitou o trabalho de pedreiros, arquitetos e artesãos. Florença tinha mais entalhadores do que açougueiros. Além disso, possuía a catedral mais suntuosa da Itália e com o maior domo (cúpula) da Europa, obra do arquiteto Brunelleschi, numa perfeita união entre arte e engenharia. Nessa cidade, um clã familiar ganhou destaque, os Médici, proprietários de uma casa bancária fundada em 1397. A família estava instalada em Florença desde o século XII e talvez os seus integrantes exercessem inicialmente a profissão de médicos, de onde é proveniente o nome "Médici".
A esse clã pertenceu Lourenço de Médici (1449-1492), chamado de "O Magnífico", tido como o maior mecenas da Renascença e que exerceu enorme influência política na cidade (acima, um busto de Lourenço feito por Andrea del Verrocchio, o mestre de Leonardo, de 1478).
Exatamente nesse momento, na pequena aldeia de Anchiano na Toscana, vizinha a Vinci (foto acima) Leonardo nasceu, no ano de 1452, em uma família do popolo minuto ("pequeninos"), grupo social composto de lojistas, artífices, negociantes e notários (tabeliães). Exatamente nesta última profissão é que encontramos o pai de Leonardo, Ser Piero. A atividade era muito requisitada e a família Vinci a exercia desde os tempos de ser Michele da Vinci, no início do século XIV. O futuro de Leonardo deveria ser esse, não fosse o fato de ser filho ilegítimo (bastardo). Aliás, algo muito comum naquela época, a ponto de um dos biógrafos recentes de Leonardo, Walter Isaacson, referir-se aqueles tempos como sendo a era de ouro dos bastardos. Vamos a alguns exemplos, entre poetas e artistas: Petrarca, Giovanni Boccaccio, Lorenzo Ghiberti, Filippo Lippi, Leon Battista Alberti, além do próprio Leonardo. Duas fontes praticamente contemporâneas nos fornecem informações sobre a sua trajetória. A primeira é a de Giorgio Vasari (que também foi pintor) em seu livro "A vida dos mais excelentes pintores, escultores e arquitetos" publicada em 1550. A outra é um manuscrito anônimo dos anos de 1540, o "Anonimo Gaddiano", que leva o nome da família a quem um dia pertenceu.
Recentemente descobriu-se um pouco mais a respeito da mãe de Leonardo do que apenas o seu nome, Caterina Lippi. Tratava-se de uma menina órfã e pobre, com apenas dezesseis anos quando deu a luz ao filho. O pai, Ser Piero, tinha vinte e quatro anos, mas sem possibilidades de contrair matrimônio com a jovem, em função da sua condição social inferior, uma camponesa, abaixo mesmo do popolo minuto. Em função disso, é que Leonardo passaria a infância com os avós paternos e na companhia do tio Francesco, irmão de seu pai, na pequena Vinci. Ao que parece, Ser Piero já estava com um casamento arranjado com uma jovem de dezesseis anos chamada Albiera, filha de um sapateiro florentino e com uma condição social adequada (leia-se: mais elevada). Os dois se casaram oito meses após o nascimento de Leonardo. Caterina, ao que parece, foi entregue aos cuidados de um homem conhecido da família Vinci, Accattabriga del Vaccha, que veio a se tornar seu marido. Dessa união, Caterina teve mais cinco filhos. A infância de Leonardo ficou dividida entre o convívio com os avós, o pai ausente (ficava mais em Florença, situada a trinta quilômetros de Vinci) e eventualmente, o contato com a mãe. Ser Piero não legitimou Leonardo porque tinha a intenção de ter um filho legal, algo que só se concretizou após seu terceiro casamento, com uma mulher seis anos mais jovem que Leonardo.
Como vimos acima, Leonardo da Vinci não poderia exercer a profissão de Ser Piero (notário), pois a guilda (corporação) dos tabeliães de Florença não admitia um non legittimo (bastardo). Da mesma forma, a Leonardo não seria permitida uma formação superior e o aprendizado no latim. Por isso, aproximadamente em 1468, quando tinha dezesseis anos, Ser Piero apresentou o filho a um conhecido seu, o artista Andrea del Verrocchio, que mantinha uma oficina (ou ateliê) em Florença (na imagem acima, suposto retrato de Verrocchio atribuído a Lorenzo di Credi). Possivelmente, Ser Piero teria levado alguns trabalhos feitos pelo adolescente (que não chegaram até nós), os quais parecem terem sido suficientes para que Verrocchio o admitisse como aprendiz, junto a outros jovens, entre eles Perugino e Sandro Botticcelli. Leonardo foi um talento precoce? Difícil dizer. Em geral, a influência de Verrocchio e de outros mestres na formação do jovem Leonardo têm sido menosprezada por muitos estudiosos.
A obra de Verrocchio como engenheiro, escultor e pintor nos revela um artista de grande qualidade. Sua oficina realizava trabalhos os mais variados, inclusive a organização de espetáculos (confecção de adereços) e festas públicas (na imagem acima, a escultura "Cristo e São Tomé" de Verrocchio concluída em 1483). Outras oficinas concorrentes também se dedicavam a tais atividades, como as de Ghirlandaio e Pollaiuollo. Portanto, Leonardo da Vinci teve uma formação que o habilitou a exercer tarefas semelhantes às de um carnavalesco dos tempos atuais, inclusive projetando engenhos e mecanismos de carros alegóricos, onde desenvolveu sua habilidade na mecânica. O trabalho no ateliê de Verrocchio era realizado de forma coletiva, com a colaboração de todos os aprendizes. Por isso, as obras que saiam da oficina não podiam ser identificadas como sendo exclusivamente de um artista ou de outro. Em geral tinham a mão de Verrocchio e também de seus aprendizes. Além de Andrea del Verrocchio, Filippo Brunelleschi (1377-1446) foi outra influência importante recebida por Leonardo, sobretudo no que diz respeito à perspectiva visual, ou seja, reproduzir uma visão tridimensional em uma superfície bidimensional. Leon Battista Alberti (1404-1472) foi autor do livro "Sobre a pintura" e um entusiasta da união entre a matemática e a arte, sendo uma referência importante na formação do futuro artista.
Leonardo era canhoto e escrevia da direita para a esquerda, com as letras viradas ao contrário para não borrar o papel com a tinta, algo que pode ocorrer ao se deslizar a mão esquerda, quando se escreve da esquerda para a direita (principalmente sendo canhoto). Da Vinci também procedia dessa forma para desenhar. Em 1472, com a idade de vinte anos, Leonardo completou o seu aprendizado tornando-se mestre, porém não se desliga imediatamente de Verrocchio, permanecendo ao seu lado ainda por vários anos. Nessa condição é que os estudiosos identificaram o primeiro trabalho em pintura de Leonardo, em uma parceria menor com Verrocchio. Menor porque a parte principal do quadro foi executada pelo mestre e não pelo aprendiz, algo absolutamente normal.
Trata-se de "O Batismo de Cristo", de aproximadamente 1475, uma encomenda feita pelos monges do convento de San Salvi em Florença, onde se vê João Batista derramando água sobre a cabeça de Jesus e observado por dois anjos. O da esquerda é atribuído a Leonardo da Vinci, bem como a paisagem ao fundo (imagem acima e no detalhe). Nota-se a grande expressividade do anjo de Leonardo, o qual diverge do rosto mais convencional proposto por Verrocchio. O tratamento da roupa, por sua vez, é confirmado por estudos de panejamento (pano) executados na mesma época pelo artista. Além disso temos o testemunho de Giorgio Vasari, que afirma que Verrocchio ficou tão impressionado com a evolução do jovem nesse trabalho, que teria decidido nunca mais pegar em um pincel. Um exagero, mas não há dúvida de que o aprendiz já se igualara ao mestre, pelo menos na pintura. Uma das novidades na técnica artística daquele momento foi a introdução na Itália da pintura a óleo, criada pelos holandeses. O óleo permitia a sobreposição de camadas finas de tinta (uma vez estando a mesma seca), podendo o artista trabalhar várias vezes (e até por vários anos) na mesma obra, característica presente no trabalho de Leonardo como pintor.
Uma paisagem das proximidades de Florença, no vale do rio Arno (imagem acima) é tida como o desenho mais antigo de Leonardo da Vinci que se conhece. Muitos artistas até então desenhavam paisagens para compor o fundo de um quadro, mas Leonardo fazia pelo prazer e pelo interesse nos detalhes da natureza, como nas camadas de rocha estratificadas e nas formações geológicas.
Pelo que se sabe, Leonardo da Vinci era um rapaz atraente, com um rosto bonito, cabelo loiro e dono de uma beleza física invejável. Em função disso, ainda adolescente, teria servido de modelo para uma estátua de Davi feita por Verrocchio (imagem acima), a qual, quando confrontada com um possível autorretrato inserido em "A adoração dos Magos" (que veremos adiante), parece não deixar dúvidas de se tratar mesmo do artista.
Em 1471, ocorreu a visita a Florença do duque de Milão, Galeácio Maria Sforza, acompanhado de seu irmão mais jovem, Ludovico Sforza. A oficina de Verrocchio participou das festividades e teria recebido a incumbência de produzir uma armadura e um elmo (capacete) oferecidos ao duque como presente. Muitos acreditam que o desenho do condottieri ou comandante militar (acima) feito por Leonardo, seja parte de um estudo para os mesmos. Possivelmente, Leonardo estabeleceu na ocasião seu primeiro contato com Ludovico, que anos depois tornou-se o seu protetor.
Em 1476, um episódio envolvendo Leonardo da Vinci acabou registrado nos arquivos de Florença e serviu para várias especulações em torno da sua sexualidade: uma acusação de sodomia (conjunção sexual anal).
Naquela época existiam nas ruas da cidade urnas, semelhantes às caixas de correio atuais, as bucchi de la Verità (bocas da Verdade), onde os moradores podiam fazer denúncias às autoridades sem serem identificados (na imagem acima, uma "boca da Verdade" da cidade de Veneza, utilizada para denunciar contrabandistas). Leonardo da Vinci e três outros rapazes teriam praticado sodomia com um jovem chamado Jacopo Saltarelli. De acordo com o que nos relata o historiador e escritor Serge Bramle, em sua biografia de Leonardo da Vinci (Imago Editora, 1989), Saltarelli era um "notório prostituto". Um inquérito foi aberto e após duas audiências o caso acabou arquivado por falta de testemunhas. Bramle nos dá uma informação sugestiva para explicar o desfecho da investigação, de que um dos jovens envolvidos era um Tornabuoni, da mesma família da mãe de Lourenço de Médici, o então governante de Florença. Por outro lado, não se sabe como reagiu o pai de Leonardo, Ser Piero e se o mesmo usou de sua influência como tabelião para intervir em favor do filho junto aos magistrados.
A homossexualidade em si não oferecia grandes riscos em Florença, apesar das punições severas previstas na época. A fama da tolerância dos florentinos em relação ao assunto ultrapassou os limites da Itália. Nos territórios do Império Alemão, o termo "florençar" servia para designar a atração do indivíduo pelo mesmo sexo. Para a Igreja Católica, o comportamento era considerado pecado e comparado ao encontro carnal entre demônios.
Com relação a Leonardo da Vinci sabe-se, com certeza, que em nenhum momento de sua vida teve uma companhia feminina, pelo contrário, sempre os seus auxiliares eram homens belos e jovens, entre os quais, o mais conhecido foi Salai (acima no desenho de Leonardo, a direita). Seria Leonardo somente um celibatário, aliás como recomendava o pintor Cennino Cennini em seu "Tratado de Pintura", que dizia que o prazer sexual tornava a mão do artista vacilante? Ou como sugeriu Sigmund Freud, o pai da psicanálise, ao dizer que suas necessidades sexuais eram reduzidas? O seu biógrafo mais recente, Walter Isaacson, o apresenta como sendo gay, da mesma forma que Miquelangelo, Botticcelli e Donatello. Trata-se de uma informação que pouco acrescenta a obra do artista, mas que lança uma luz a respeito do imaginário sobre a sexualidade naqueles tempos.
Quando alcançou os vinte e cinco anos Leonardo da Vinci trabalhou em uma pintura, que até recentemente era considerada como a sua primeira obra feita por completo: "A Anunciação" (imagem mais acima). Trata-se de um dos temas mais comuns do Renascimento, o momento em que o anjo Gabriel revela à Virgem Maria que ela se tornaria a mãe de Jesus. A atribuição da autoria a Leonardo foi por muito tempo discutida em função de alguns "defeitos". O detalhamento exagerado do pano que recobre o colo da Virgem Maria e o fato deste se estender sobre um braço da cadeira, dando a impressão de que a Virgem têm "três pernas" (na imagem acima, estudo para o anjo Gabriel). A base do atril (onde o livro está apoiado) está mais próxima do observador do que de Maria e um de seus braços parece mais extenso do que o outro. Na verdade, trata-se do trabalho de um pintor ainda em formação. Com base no fato de termos o uso simultâneo da têmpera (a base de água, semelhante ao guache) e do óleo, existe a tendência atual de apontar ainda a mão de Verrocchio (que jamais usou tinta a base de óleo) no quadro.
Duas Madonas (pinturas cujo tema é a Virgem Maria com o menino Jesus) possivelmente pintadas nessa época, chegaram até nós: "Madona e a criança com flores" ou "Madona Benois" e a "Madona do cravo" ou "Madona de Munique" (acima, as duas obras respectivamente de cima para baixo). Nas mesmas já podemos perceber duas das características mais importantes do Leonardo pintor. O forte contraste entre luz e sombra, conhecido como chiaroscuro, a diluição das linhas e dos contornos por meio do sfumato, como nas paisagens de fundo, as quais são envolvidas por uma névoa tênue que desfaz as demarcações, exatamente como percebemos na realidade.
A representação do Menino Jesus demonstra que Leonardo da Vinci tinha feito desenhos de observação de bebês. Aliás, na própria família Leonardo pode encontrar tais modelos, pois Ser Piero, finalmente, tornou-se pai de dois filhos em seu terceiro casamento, entre os anos de 1475 e 1476. Até então, os bebês costumavam ser representados por outros artistas como adultos em tamanho menor (acima, estudos de Leonardo com o tema a Virgem e o Menino).
O retrato de Ginevra de' Benci é uma amostra do que estava por vir em relação ao Leonardo da Vinci pintor. Trata-se de sua primeira obra não religiosa. A jovem do retrato, filha de um rico banqueiro de Florença, pertencia a uma família aristocrática. O marido de Ginevra, Luigi Nicolini, era do ramo da tecelagem, ou seja, um endinheirado em busca de prestígio social. O pai de Leonardo, por sua vez, prestara serviços à família Benci e talvez tenha ajudado o filho a obter a encomenda. Mas, há outra história. O embaixador de Veneza em Florença, Bernardo Bembo nutriria uma paixão platônica pela jovem e teria, em função disso, requisitado um quadro da amada a fim de ter o seu rosto por perto. Originalmente foram pintadas as mãos de Ginevra, mas essa parte da tela foi cortada. Um estudo de mãos de Leonardo nos revela a intenção de incluir as mesmas no quadro (acima, o quadro e o estudo feito pelo artista). Atrás de Ginevra estão os ramos de junípero, que em italiano é ginepro, uma referência ao nome da retratada. O quadro reflete uma representação psicológica, com um certo ar de tristeza na jovem, que era doente e não teve filhos. Trata-se da única tela de Leonardo da Vinci que se encontra na América (na National Gallery de Washington).
Em 1477, Leonardo da Vinci deixou o ateliê de Verrocchio e conseguiu obter mais encomendas. A "Adoração dos Magos" é uma delas e tida como a mais famosa pintura inacabada da história da arte (primeira imagem acima). O mosteiro de San Donato de Florença fez a encomenda em março de 1481. É muito provável que o pai de Leonardo, Ser Piero, tenha interferido mais uma vez em favor do filho. Um contrato complexo foi feito e a obra deveria ser entregue em trinta meses. Ao que parece, o artista já tinha a fama de trabalhar de forma lenta ou mesmo de não concluir as encomendas. Um estudo de perspectiva para o quadro, seguindo os métodos de Brunelleschi e Alberti chegou até nós. De Alberti, Leonardo procurou assimilar uma máxima: "O bom pintor deve pintar duas coisas principais, o homem e a intenção de sua mente". Isso deveria ser obtido por meio de gestos e movimentos corporais. Quanto mais as ações da figura representada expressassem os sentimentos que a impulsionavam, mais admirável se tornaria essa figura. Isso fez com que vários detalhes necessitassem ser trabalhados, daí o excessivo perfeccionismo do artista, que preferia mais a fase da concepção da obra do que a execução. Acredita-se que uma das figuras da Adoração seja o próprio Leonardo da Vinci (detalhe acima). O artista partiu para Milão deixando a obra inacabada e mais tarde, outro pintor fez um painel substituto para o mosteiro.
Muitos trabalhos de Leonardo da Vinci ficaram incompletos porque o artista tentava aperfeiçoa-los ao longo do tempo. Parece ser esse o caso de "São Jerônimo" (imagem mais acima), o qual, pode ter sido realizado em duas etapas, em 1480 e 1510 e talvez estivesse apoiado em seus estudos posteriores de anatomia e na dissecação de cadáveres feitos durante a sua primeira estada em Milão (detalhe acima). Não se sabe quem encomendou a obra, mas sabemos como o trabalho foi encontrado depois de mais de trezentos anos. No começo do século XIX, o Cardeal Fesch, tio de Napoleão Bonaparte, descobriu em um antiquário de Roma um armário, que tinha como revestimento interno o tecido da tela com a obra, porém sem a cabeça. O Cardeal questionou onde a mesma poderia estar e acabou por encontrá-la, após meses de procura, em uma sapataria que a tinha pregada na parede e então, finalmente, as partes puderam ser remontadas. Além dos detalhes do pescoço e as costelas salientes do santo, temos também a figura do leão, o qual, segundo Serge Bramle, Leonardo desenhou ao vivo. De acordo com a tradição cristã, depois do santo ter retirado um espinho da pata do animal, o leão passou a conviver com São Jerônimo, que redigiu a versão latina da Bíblia (a Vulgata).
A fama de não entregar as obras, o episódio da sodomia e o pouco crédito que tinha no entorno de Lourenço, o Magnífico, muito provavelmente contribuíram para que Leonardo da Vinci resolvesse deixar a sua Toscana natal e a cidade de Florença. Na verdade, Lourenço de Médici fazia poucas encomendas a artistas, embora tenha promovido o jovem escultor Miquelangelo. As letras parecem te-lo atraído mais e por isso, gostava de estar em meio aos poetas e letrados. Como vimos, Leonardo não teve a formação superior e não sabia latim. Embora levasse em consideração os clássicos da Antiguidade, o jovem fixou os seus olhos na observação da natureza e dela buscava a inspiração para os seus estudos e trabalhos.
Leonardo da Vinci chegou em 1482 a Milão, na Lombardia (norte da Itália) com a idade de trinta anos, como uma espécie de diplomata cultural. A cidade tinha 125 mil habitantes, bem maior do que Florença e era governada por uma corte comandada por Ludovico Sforza, também chamado de "O Mouro" (na imagem acima, o seu retrato de perfil feito por um artista desconhecido). Sim, aquele que visitou Florença na companhia do irmão mais velho (que era o duque de Milão) em 1471. Milão era uma cidade-Estado de tipo feudal, inicialmente comandada pela família Visconti e depois pelos Sforza. Ao contrário de Florença, Milão não dispunha de muitos artistas, embora tivesse nas proximidades uma universidade, a de Pávia, fundada em 1361, com advogados, filósofos, médicos e matemáticos. Na cidade lombarda, Leonardo viveu os momentos mais férteis de sua vida em termos de criação e estudos. O rascunho de uma carta de Leonardo dirigida a Ludovico, o Mouro chegou até nós. Na mesma, o mestre florentino oferece os seus serviços como engenheiro militar, dizendo-se capaz de projetar as armas mais variadas e ao final, no décimo item, afirma que "em tempos de paz" poderia se equiparar a qualquer outro em arquitetura, escultura e em pintura. E acrescenta estar em condições de trabalhar no acalentado projeto do Mouro, uma estátua equestre (cavaleiro montado a cavalo) que deveria homenagear o seu pai, Francesco Sforza.
Vale lembrar que, apesar do enorme talento como projetista e engenheiro, nem tudo o que Leonardo da Vinci desenhou saiu exclusivamente da sua cabeça, como por exemplo, os projetos militares. Ele pesquisou outros estudiosos do assunto, entre eles Roberto Valturio, que escreveu um livro intitulado De Re Militari ("Das Coisas Militares"), um tratado sobre a arte da guerra e com reproduções de vários armamentos. O livro foi publicado em latim em 1472 e em italiano em 1483, logo depois da chegada de Leonardo a Milão. O florentino aprimorou muitos projetos de Valturio, como o carro-ceifador com laminas giratórias para ser utilizado em combate (primeira imagem acima, onde Leonardo detalha os corpos decepados pela máquina). Um Leonardo diferente daquilo que estamos habituados a ver e que se tornou vegetariano pelo amor que sentia aos animais, apresentando uma máquina para despedaçar e matar seres humanos. Outro dispositivo projetado pelo florentino é a besta gigante de 1485. A mesma deveria ter vinte e cinco metros de comprimento e transportada ao campo de batalha por uma enorme carruagem (imagem acima).
Pelo que nos informa Walter Isaacson, apenas um dos projetos militares de Leonardo saiu do papel: o sistema de rodete. O mesmo era um dispositivo que produzia faísca a fim de detonar a pólvora contida em um mosquete ou em uma arma portátil. Nenhuma das demais armas imaginadas por Leonardo da Vinci seria utilizada por Ludovico, até porque o governante de Milão não se envolveu em nenhum conflito militar sério até a invasão francesa de 1499, que pôs fim ao seu governo (acima, projeto feito por Leonardo, de uma máquina de assalto a uma muralha inimiga).
Por incrível que pareça, não foi como arquiteto ou engenheiro militar que Leonardo da Vinci fez a sua entrada na corte milanesa, mas sim como produtor de espetáculos. Tal atividade envolvia vários conhecimentos que atraiam a atenção de Leonardo: cenografia, música, figurinos, coreografia, alegorias e engenhocas que produzissem algum efeito para a plateia. Um desses espetáculos foi uma performance conhecida como "A Festa do Paraíso". No meio da apresentação a cortina subiu e revelou uma abóboda celestial no formato de um ovo pela metade. Tochas simbolizaram as estrelas e ao fundo os signos do zodíaco apareciam iluminados. Atores interpretaram os planetas por meio de movimentos, cada um em sua órbita. A mecânica empregada nas peças e espetáculos interessava a Leonardo da Vinci tanto quanto a parte artística, pois para o mestre florentino eram conhecimentos atrelados.
O desenho de caricaturas, que na época eram conhecidas por grotescos (imagens acima), também serviam para entreter os convidados da corte. Leonardo tinha o costume de percorrer ruas, comércio, tavernas para encontrar ou descobrir rostos exóticos e inclui-los em seus trabalhos.
Em Milão, Leonardo da Vinci ficou conhecido por sua simpatia e inteligência, uma pessoa agradável de se conversar e também gentil. Apesar de vegetariano, em suas listas de compras aparece a carne, que era consumida pelos outros residentes de sua casa, sendo o mais conhecido deles o filho de um camponês pobre chamado Gian Giacomo Caprotti, apelidado de Salai, que significava "diabinho" (acima, perfil de Salai desenhado por Leonardo). A data em que o garoto foi morar com o florentino ficou anotada (em 1490), quando Leonardo tinha 38 anos e o garoto dez. Salai tornou-se assistente, copista e talvez, seu amante, segundo nos informa Walter Isaacson. O garoto fez jus ao apelido recebido, pois Leonardo deixou anotações esporádicas citando que Salai se comportava de forma inadequada na mesa de refeições (era glutão), que roubava o seu dinheiro e o de seus convidados. Apesar disso, Leonardo continuou mantendo o rapaz, que o acompanhou quase até o final de sua vida e foi contemplado no testamento do florentino.
Em 1487, Leonardo da Vinci participou de um concurso promovido pelas autoridades de Milão, para o projeto de um zimbório (parte mais alta e exterior da cúpula de uma igreja) destinado a catedral de Milão, que já tinha cem anos, sendo a oportunidade para o florentino apresentar-se também como arquiteto. Embora não tivesse saído vencedor, Leonardo da Vinci teve a oportunidade de trabalhar com dois dos maiores nomes da arquitetura de seu tempo: Donato Bramante (futuro arquiteto da catedral de São Pedro em Roma) e Francesco di Giorgio Martini. Uma fértil amizade intelectual se estabeleceu entre Bramante e Leonardo. Anos depois, os dois trabalharam juntos na reforma do convento de Santa Maria delle Grazie em Milão e no acréscimo de um salão de refeições para os padres (Leonardo ficou encarregado de pintar a "Última Ceia" em uma das paredes).
Enquanto ainda trabalhavam no projeto do zimbório, Leonardo e Francesco di Giorgio fizeram uma viagem a Pavia (a cerca de quarenta quilômetros de Milão e, como já vimos, sede de uma importante universidade) onde uma catedral estava sendo erguida. Na biblioteca local existia um manuscrito do Tratado de Arquitetura de Vitrúvio, antigo oficial do exército romano ao tempo de Julio César (mais uma obra da Antiguidade Clássica redescoberta no Renascimento). O texto do arquiteto despertou o interesse dos dois no que dizia respeito à analogia (paralelo) entre o corpo humano e o universo, sendo o primeiro concebido como uma espécie de "mundo menor", pois as proporções do corpo humano e a sua simetria fundamentariam todas as demais construções do mundo. Por exemplo, um corpo com suas formas perfeitas, poderia ser a base do projeto de um templo ou igreja. Formas perfeitas? Pelos padrões de Vitrúvio, a medida ideal da distância entre o queixo e o topo da testa deveria ser correspondente a um décimo da altura do homem ou ainda, a distância entre os braços abertos do homem é igual a sua altura. O desenho do "Homem Vitruviano" de Leonardo da Vinci (imagem acima) procura demonstrar tais proporções. Seria o mesmo um autorretrato? Fica a dúvida. Como destaca mais uma vez Walter Isaacson, os estudos sobre Vitrúvio realizados por Leonardo e di Giorgio, demonstram a existência de uma colaboração intelectual entre os sábios na busca pelo conhecimento, durante a Renascença.
Quando se apresentou a Ludovico o Mouro, Leonardo ofereceu-se para realizar o grandioso monumento equestre de Francesco Sforza (pai de Ludovico). Da Vinci concebeu um cavalo de bronze com um cavaleiro montado, os quais deveriam pesar 75 toneladas, devendo se constituir no maior monumento equestre construído até então e superando os similares dos tempos da Roma Antiga. Contudo, o foco maior de Leonardo estava mais no cavalo do que no cavaleiro (como demonstram os estudos acima), o que fez com que o monumento ficasse conhecido apenas como Il Cavallo. Imediatamente, Leonardo começou a estudar esse animal, chegando mesmo a planejar um tratado sobre a anatomia dos cavalos. Ao mesmo tempo, projetou e idealizou estábulos mais limpos por meio de um sistema de comportas e pisos inclinados, a fim de facilitar a remoção do esterco.
Eis novamente o Leonardo da Vinci que se dispersa em estudos paralelos (na imagem acima, desenho de Leonardo com cavalo em movimento). A demora na elaboração do projeto deixou Ludovico preocupado e este chegou a requisitar a Florença artistas especializados nesse tipo de obra. Mas Leonardo conseguiu concluir uma versão em argila de tamanho natural, que foi exposta em novembro de 1493. Pelo que sabemos, o impacto foi grande e os elogios unânimes. Em seguida viria a parte mais complicada: fundir o monumento em bronze. Leonardo desejava fazê-lo em um único molde (com cavalo e cavaleiro), dentro do qual seria despejado o bronze derretido através de vários buracos, a fim de preencher internamente o gigantesco molde de maneira uniforme. Desta vez a conclusão da obra não dependeu só de Leonardo da Vinci. Em 1494, tropas francesas invadiram a Itália e o bronze destinado ao monumento equestre foi desviado para a fabricação de canhões. Cinco anos depois os franceses entraram em Milão e o que restava do modelo em argila do Il Cavallo foi destruído por arqueiros franceses que o utilizaram para a pratica de tiro ao alvo.
Alguns anos depois, Leonardo da Vinci ainda tentou encaminhar um projeto de monumento equestre, agora em homenagem ao militar francês Jean-Jacques Trivúlcio, o qual, certamente, teve conhecimento do modelo de argila feito por Leonardo para Ludovico, o Mouro (acima, esboços de Leonardo para esse novo projeto). Mais uma vez, as circunstâncias políticas o impediram de prosseguir nessa empreitada, pois os Sforza (sem Ludovico, o Mouro) recuperaram o controle de Milão em poder dos franceses.
Leonardo da Vinci intensificou os estudos sobre anatomia humana durante os seus anos em Milão. Segundo Leon Battista Alberti, o conhecimento da anatomia era fundamental para um artista fazer a representação correta de pessoas e animais. Os artistas de Florença já tinham tentado entender o funcionamento dos músculos do corpo humano, como por exemplo Antonio de Pollaiuolo, que teria realizado dissecações parciais de cadáveres com tal finalidade. Leonardo da Vinci travou contato com os médicos da Universidade de Pávia e conheceu os detalhes do processo de dissecação em 1489. Da Vinci vai muito além daquilo que era necessário para as suas pinturas e analisou em detalhes o crânio humano (como mostram os desenhos acima), inclusive com descrições da dentição (imagem acima). Como Leonardo buscava em suas pinturas mostrar as emoções das figuras através dos gestos, daí a tentativa de compreender o funcionamento do sistema nervoso e a relação deste com as impressões ópticas (da visão). Da Vinci acreditava que os impulsos visuais eram processados no cérebro e por meio do sistema nervoso alcançavam os músculos, determinando as atitudes e as emoções.
Uma das primeiras pinturas feitas por Leonardo da Vinci em Milão (se não for a primeira) é um quadro intitulado "O Músico" (imagem acima). A obra está incompleta (como se observa nas vestes do retratado) e para muitos estudiosos foi apenas parcialmente feita pelo mestre florentino, tendo também a participação de aprendizes. Acredita-se que a figura seja do músico Atalante Migliorotti que acompanhara Leonardo na viajem de Florença para Milão e que chamou a atenção do artista por sua beleza. Nesse trabalho, Leonardo da Vinci levou ao extremo o efeito do chiaroescuro (contraste entre claro e escuro).
Sem ter a formação acadêmica proporcionada por uma universidade, Leonardo da Vinci procurou suprir essa lacuna buscando experimentar e testar o que observava nos livros, num momento em que muitos intelectuais ainda se limitavam a apenas reproduzir o conteúdo dos mesmos. Isso não significava desprezo pelas teorias, ao contrário, ele desejava apenas comprovar empiricamente as mesmas. Aliás como faziam os estudiosos e cientistas do mundo islâmico. Leonardo tornou a natureza e o próprio homem o centro de suas atenções e estudos. A partir disso, em muitas situações, Leonardo foi além das próprias teorias e vislumbrou um horizonte de conhecimentos, muitos dos quais ainda se mostravam pouco aplicáveis ao momento em que vivia, daí afirmar-se que estava à frente de seu tempo. A sua passagem por Milão ainda nos revelará muito do Leonardo da Vinci artista e cientista. Mas, isso fica para a segunda e última parte desta postagem...
Para ler:
O livro escrito por Walter Isaacson intitulado Leonardo da Vinci (Rio de Janeiro: editora Intrínseca, 2017) propõe novas abordagens e traz informações atualizadas a respeito desta figura de grande destaque no Renascimento Cultural. Isaacson procura desmistificar a aura de "gênio" que foi imposta ao artista e cientista, mostrando que muitas de suas observações e descobertas foram fruto do contato com outros intelectuais, de muitas leituras, do ambiente favorável à troca de informações que já existia na época e claro, do esforço pessoal do próprio Leonardo, que se não foi o marco zero do conhecimento moderno (e será que alguém mais poderia ser?), deu uma contribuição fundamental para o seu avanço. Teve erros e acertos, não publicou os seus textos e conclusões, deixando muita coisa para futuras observações de outros estudiosos. O livro de Isaacson deve servir de base para um filme sobre o personagem a ser estrelado por outro Leonardo, o Di Caprio. Pelo menos é o que foi anunciado no início de 2018...
Crédito das imagens:
Pálio, livro de matemática comercial, Cristo e São Tomé de Verrocchio e bucchi de la Verità em Veneza: Renascença. Biblioteca de História Universal Life. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1970, páginas 155, 55, 52 e 36 respectivamente.
Busto de Lourenço de Médici por Verrocchio: National Gallery of Washington, cartão postal (acervo do autor).
Detalhe do autorretrato de Leonardo, condottieri, estudo de pano para A Anunciação, as duas Madonas, estudo de bebês, retrato de Ginevra de' Benci, estudo de mãos, A Adoração dos Magos, detalhe de A Adoração dos Magos, São Jerônimo, grupo de grotescos, estudo de cavalos (fundo azulado), O Homem Vitruviano, projeto de monumento para o comandante Trivúlcio e O Músico: Leonardo de Walter Pater. Editora Círculo do Livro, 1977.
Desenho com grotesco de perfil, de crânios, projeto de máquina para assaltar muralhas: https://www.rct.uk/
Aldeia (atual cidade) de Vinci, retrato de Verrocchio, O Batismo de Cristo, Anunciação, estátua de David de Verrocchio e retrato de Ludovico, o Mouro: Wikipédia.
Perfil de idoso e de Salai e perfil de Salai: http://www.drawingsofleonardo.org
Florença em 1480, primeiro desenho conhecido de Leonardo, estudo de anatomia, carro-ceifador, besta gigante e estudo para o monumento Sforza: Leonardo da Vinci de Walter Isaacson, Editora Intrínseca, 2017, páginas 41, 68, 435, 121 e 188 respectivamente.
A Itália da Renascença tinha uma configuração política diferente do que é hoje, sendo o seu território formado por um conjunto de estados independentes (para lembrar, a unificação só veio em 1870), cujo núcleo eram as cidades que adquiriram destaque econômico e político nos últimos séculos da Idade Média. Em certos períodos, alguns desses pequenos estados se sobressaiam sobre os demais, como Siena, Milão, Veneza e Florença (a Firenze dos italianos). Além desses, ainda existiam os territórios pertencentes aos Estados Papais, incluindo a cidade de Roma, governados pela Igreja Católica, cuja autoridade máxima era o papa e ao sul, o Reino de Nápoles e da Sicília. A península italiana desfrutava de uma vantagem geográfica, por estar situada entre a Europa central e o Oriente, no cruzamento de rotas comerciais que traziam produtos como as especiarias (temperos), a seda, a porcelana e os tapetes, todos provenientes da Ásia. Esse dinamismo econômico permitiu o surgimento de uma vigorosa classe mercantil, também ligada às manufaturas (principalmente de tecidos) e à atividade financeira (bancos), o chamado popolo grasso ("homens gordos") que constituirá a burguesia. Alguns, em busca de prestígio, misturaram-se com a antiga aristocracia de origem feudal, a ponto de ser difícil distinguir a pureza de sangue da riqueza recém adquirida no comércio. Muitas dessas famílias acabaram alcançando enorme influência política, como os Baglioni em Perúgia, os Bentivoglio em Bolonha e os Médici em Florença.
Em função das suas atividades, esses clãs familiares viviam nas cidades, onde a busca por prestígio social levou-os a um envolvimento maior com o cotidiano urbano, patrocinando festividades, jogos, espetáculos públicos e obras arquitetônicas (na imagem acima, o palio ou corrida de cavalos, realizada até hoje na cidade de Siena). Daí o fato de se cercarem de artistas, arquitetos, poetas, músicos, escultores e pintores, protegendo e empregando esses profissionais. Sem esses patrocinadores, chamados de mecenas, a arte do Renascimento não teria se concretizado.
Como destaca o historiador Nicolau Sevcenko em seu livro "O Renascimento" (Atual Editora, 1994) esse momento histórico estimulou a inventividade, a observação atenta da natureza e os experimentos, base daquilo que veio a se chamar de ciência. Surgem novas técnicas de exploração na agricultura, na metalurgia, na construção naval, na navegação (bússola, astrolábio, cartografia) e na arte da guerra (uso da pólvora, canhões).
Entre os comerciantes e financistas começaram a ser adotadas práticas que se tornaram normais no capitalismo: acordos de sociedade; seguros marítimos; transferência de crédito e a aplicação da noção de ativo e passivo na contabilidade das firmas (na imagem acima, um livro de matemática para comerciantes tendo no lado direito uma tabela de câmbio de conversão para moedas florentinas). Além de tudo isso, tivemos o aparecimento da imprensa (tipografia) fazendo com que os livros atingissem maior número de leitores. Por incrível que possa parecer, os indivíduos associados diretamente a essas mudanças vislumbravam o passado e não o futuro. A Antiguidade Clássica (civilizações grega e romana) começou a ser revivida por meio de intelectuais conhecidos como humanistas. O interesse pelos antigos escritores, historiadores, poetas e artistas foi despertado a tal ponto, que se convencionou dizer a respeito do fim de uma "idade das trevas" e o renascer da civilização, daí o termo Renascença. A noção de que a Idade Média representava a "escuridão", embora enganosa, surgiu a partir dessa ideia.
Os anos de 1300 (Trecento) marcaram o início dessa renovação cultural, sendo a época do poeta Dante Alighieri, dos pintores Giotto e Masaccio. Contudo, em 1348, a Itália (como também a Europa) foi abalada pela Peste Negra (ou peste bubônica) que dizimou algo em torno da terça parte da população do continente. Em função do dinamismo da economia italiana, a recuperação lá foi mais rápida.
No final do Trecento é que tivemos a ascensão de Florença (na gravura acima a cidade, cortada pelo rio Arno, em 1480), na região da Toscana (noroeste da Itália) com sua atividade mercantil e sua manufatura têxtil (lã). A mesma tinha um ambiente propício para o desenvolvimento das artes, pois era uma cidade rica, tinha moeda forte (o florim) e contava com uma universidade. Na época em que Leonardo lá chegou, a sua população girava em torno dos 40 mil habitantes e um terço dela era alfabetizada, algo inédito naqueles tempos. Aproximadamente uma centena de famílias muito ricas viviam em Florença. Entre 1450 e 1470 pelo menos trinta palacetes foram erguidos na cidade, o que requisitou o trabalho de pedreiros, arquitetos e artesãos. Florença tinha mais entalhadores do que açougueiros. Além disso, possuía a catedral mais suntuosa da Itália e com o maior domo (cúpula) da Europa, obra do arquiteto Brunelleschi, numa perfeita união entre arte e engenharia. Nessa cidade, um clã familiar ganhou destaque, os Médici, proprietários de uma casa bancária fundada em 1397. A família estava instalada em Florença desde o século XII e talvez os seus integrantes exercessem inicialmente a profissão de médicos, de onde é proveniente o nome "Médici".
A esse clã pertenceu Lourenço de Médici (1449-1492), chamado de "O Magnífico", tido como o maior mecenas da Renascença e que exerceu enorme influência política na cidade (acima, um busto de Lourenço feito por Andrea del Verrocchio, o mestre de Leonardo, de 1478).
Exatamente nesse momento, na pequena aldeia de Anchiano na Toscana, vizinha a Vinci (foto acima) Leonardo nasceu, no ano de 1452, em uma família do popolo minuto ("pequeninos"), grupo social composto de lojistas, artífices, negociantes e notários (tabeliães). Exatamente nesta última profissão é que encontramos o pai de Leonardo, Ser Piero. A atividade era muito requisitada e a família Vinci a exercia desde os tempos de ser Michele da Vinci, no início do século XIV. O futuro de Leonardo deveria ser esse, não fosse o fato de ser filho ilegítimo (bastardo). Aliás, algo muito comum naquela época, a ponto de um dos biógrafos recentes de Leonardo, Walter Isaacson, referir-se aqueles tempos como sendo a era de ouro dos bastardos. Vamos a alguns exemplos, entre poetas e artistas: Petrarca, Giovanni Boccaccio, Lorenzo Ghiberti, Filippo Lippi, Leon Battista Alberti, além do próprio Leonardo. Duas fontes praticamente contemporâneas nos fornecem informações sobre a sua trajetória. A primeira é a de Giorgio Vasari (que também foi pintor) em seu livro "A vida dos mais excelentes pintores, escultores e arquitetos" publicada em 1550. A outra é um manuscrito anônimo dos anos de 1540, o "Anonimo Gaddiano", que leva o nome da família a quem um dia pertenceu.
Recentemente descobriu-se um pouco mais a respeito da mãe de Leonardo do que apenas o seu nome, Caterina Lippi. Tratava-se de uma menina órfã e pobre, com apenas dezesseis anos quando deu a luz ao filho. O pai, Ser Piero, tinha vinte e quatro anos, mas sem possibilidades de contrair matrimônio com a jovem, em função da sua condição social inferior, uma camponesa, abaixo mesmo do popolo minuto. Em função disso, é que Leonardo passaria a infância com os avós paternos e na companhia do tio Francesco, irmão de seu pai, na pequena Vinci. Ao que parece, Ser Piero já estava com um casamento arranjado com uma jovem de dezesseis anos chamada Albiera, filha de um sapateiro florentino e com uma condição social adequada (leia-se: mais elevada). Os dois se casaram oito meses após o nascimento de Leonardo. Caterina, ao que parece, foi entregue aos cuidados de um homem conhecido da família Vinci, Accattabriga del Vaccha, que veio a se tornar seu marido. Dessa união, Caterina teve mais cinco filhos. A infância de Leonardo ficou dividida entre o convívio com os avós, o pai ausente (ficava mais em Florença, situada a trinta quilômetros de Vinci) e eventualmente, o contato com a mãe. Ser Piero não legitimou Leonardo porque tinha a intenção de ter um filho legal, algo que só se concretizou após seu terceiro casamento, com uma mulher seis anos mais jovem que Leonardo.
Como vimos acima, Leonardo da Vinci não poderia exercer a profissão de Ser Piero (notário), pois a guilda (corporação) dos tabeliães de Florença não admitia um non legittimo (bastardo). Da mesma forma, a Leonardo não seria permitida uma formação superior e o aprendizado no latim. Por isso, aproximadamente em 1468, quando tinha dezesseis anos, Ser Piero apresentou o filho a um conhecido seu, o artista Andrea del Verrocchio, que mantinha uma oficina (ou ateliê) em Florença (na imagem acima, suposto retrato de Verrocchio atribuído a Lorenzo di Credi). Possivelmente, Ser Piero teria levado alguns trabalhos feitos pelo adolescente (que não chegaram até nós), os quais parecem terem sido suficientes para que Verrocchio o admitisse como aprendiz, junto a outros jovens, entre eles Perugino e Sandro Botticcelli. Leonardo foi um talento precoce? Difícil dizer. Em geral, a influência de Verrocchio e de outros mestres na formação do jovem Leonardo têm sido menosprezada por muitos estudiosos.
A obra de Verrocchio como engenheiro, escultor e pintor nos revela um artista de grande qualidade. Sua oficina realizava trabalhos os mais variados, inclusive a organização de espetáculos (confecção de adereços) e festas públicas (na imagem acima, a escultura "Cristo e São Tomé" de Verrocchio concluída em 1483). Outras oficinas concorrentes também se dedicavam a tais atividades, como as de Ghirlandaio e Pollaiuollo. Portanto, Leonardo da Vinci teve uma formação que o habilitou a exercer tarefas semelhantes às de um carnavalesco dos tempos atuais, inclusive projetando engenhos e mecanismos de carros alegóricos, onde desenvolveu sua habilidade na mecânica. O trabalho no ateliê de Verrocchio era realizado de forma coletiva, com a colaboração de todos os aprendizes. Por isso, as obras que saiam da oficina não podiam ser identificadas como sendo exclusivamente de um artista ou de outro. Em geral tinham a mão de Verrocchio e também de seus aprendizes. Além de Andrea del Verrocchio, Filippo Brunelleschi (1377-1446) foi outra influência importante recebida por Leonardo, sobretudo no que diz respeito à perspectiva visual, ou seja, reproduzir uma visão tridimensional em uma superfície bidimensional. Leon Battista Alberti (1404-1472) foi autor do livro "Sobre a pintura" e um entusiasta da união entre a matemática e a arte, sendo uma referência importante na formação do futuro artista.
Leonardo era canhoto e escrevia da direita para a esquerda, com as letras viradas ao contrário para não borrar o papel com a tinta, algo que pode ocorrer ao se deslizar a mão esquerda, quando se escreve da esquerda para a direita (principalmente sendo canhoto). Da Vinci também procedia dessa forma para desenhar. Em 1472, com a idade de vinte anos, Leonardo completou o seu aprendizado tornando-se mestre, porém não se desliga imediatamente de Verrocchio, permanecendo ao seu lado ainda por vários anos. Nessa condição é que os estudiosos identificaram o primeiro trabalho em pintura de Leonardo, em uma parceria menor com Verrocchio. Menor porque a parte principal do quadro foi executada pelo mestre e não pelo aprendiz, algo absolutamente normal.
Trata-se de "O Batismo de Cristo", de aproximadamente 1475, uma encomenda feita pelos monges do convento de San Salvi em Florença, onde se vê João Batista derramando água sobre a cabeça de Jesus e observado por dois anjos. O da esquerda é atribuído a Leonardo da Vinci, bem como a paisagem ao fundo (imagem acima e no detalhe). Nota-se a grande expressividade do anjo de Leonardo, o qual diverge do rosto mais convencional proposto por Verrocchio. O tratamento da roupa, por sua vez, é confirmado por estudos de panejamento (pano) executados na mesma época pelo artista. Além disso temos o testemunho de Giorgio Vasari, que afirma que Verrocchio ficou tão impressionado com a evolução do jovem nesse trabalho, que teria decidido nunca mais pegar em um pincel. Um exagero, mas não há dúvida de que o aprendiz já se igualara ao mestre, pelo menos na pintura. Uma das novidades na técnica artística daquele momento foi a introdução na Itália da pintura a óleo, criada pelos holandeses. O óleo permitia a sobreposição de camadas finas de tinta (uma vez estando a mesma seca), podendo o artista trabalhar várias vezes (e até por vários anos) na mesma obra, característica presente no trabalho de Leonardo como pintor.
Uma paisagem das proximidades de Florença, no vale do rio Arno (imagem acima) é tida como o desenho mais antigo de Leonardo da Vinci que se conhece. Muitos artistas até então desenhavam paisagens para compor o fundo de um quadro, mas Leonardo fazia pelo prazer e pelo interesse nos detalhes da natureza, como nas camadas de rocha estratificadas e nas formações geológicas.
Pelo que se sabe, Leonardo da Vinci era um rapaz atraente, com um rosto bonito, cabelo loiro e dono de uma beleza física invejável. Em função disso, ainda adolescente, teria servido de modelo para uma estátua de Davi feita por Verrocchio (imagem acima), a qual, quando confrontada com um possível autorretrato inserido em "A adoração dos Magos" (que veremos adiante), parece não deixar dúvidas de se tratar mesmo do artista.
Em 1471, ocorreu a visita a Florença do duque de Milão, Galeácio Maria Sforza, acompanhado de seu irmão mais jovem, Ludovico Sforza. A oficina de Verrocchio participou das festividades e teria recebido a incumbência de produzir uma armadura e um elmo (capacete) oferecidos ao duque como presente. Muitos acreditam que o desenho do condottieri ou comandante militar (acima) feito por Leonardo, seja parte de um estudo para os mesmos. Possivelmente, Leonardo estabeleceu na ocasião seu primeiro contato com Ludovico, que anos depois tornou-se o seu protetor.
Em 1476, um episódio envolvendo Leonardo da Vinci acabou registrado nos arquivos de Florença e serviu para várias especulações em torno da sua sexualidade: uma acusação de sodomia (conjunção sexual anal).
Naquela época existiam nas ruas da cidade urnas, semelhantes às caixas de correio atuais, as bucchi de la Verità (bocas da Verdade), onde os moradores podiam fazer denúncias às autoridades sem serem identificados (na imagem acima, uma "boca da Verdade" da cidade de Veneza, utilizada para denunciar contrabandistas). Leonardo da Vinci e três outros rapazes teriam praticado sodomia com um jovem chamado Jacopo Saltarelli. De acordo com o que nos relata o historiador e escritor Serge Bramle, em sua biografia de Leonardo da Vinci (Imago Editora, 1989), Saltarelli era um "notório prostituto". Um inquérito foi aberto e após duas audiências o caso acabou arquivado por falta de testemunhas. Bramle nos dá uma informação sugestiva para explicar o desfecho da investigação, de que um dos jovens envolvidos era um Tornabuoni, da mesma família da mãe de Lourenço de Médici, o então governante de Florença. Por outro lado, não se sabe como reagiu o pai de Leonardo, Ser Piero e se o mesmo usou de sua influência como tabelião para intervir em favor do filho junto aos magistrados.
A homossexualidade em si não oferecia grandes riscos em Florença, apesar das punições severas previstas na época. A fama da tolerância dos florentinos em relação ao assunto ultrapassou os limites da Itália. Nos territórios do Império Alemão, o termo "florençar" servia para designar a atração do indivíduo pelo mesmo sexo. Para a Igreja Católica, o comportamento era considerado pecado e comparado ao encontro carnal entre demônios.
Com relação a Leonardo da Vinci sabe-se, com certeza, que em nenhum momento de sua vida teve uma companhia feminina, pelo contrário, sempre os seus auxiliares eram homens belos e jovens, entre os quais, o mais conhecido foi Salai (acima no desenho de Leonardo, a direita). Seria Leonardo somente um celibatário, aliás como recomendava o pintor Cennino Cennini em seu "Tratado de Pintura", que dizia que o prazer sexual tornava a mão do artista vacilante? Ou como sugeriu Sigmund Freud, o pai da psicanálise, ao dizer que suas necessidades sexuais eram reduzidas? O seu biógrafo mais recente, Walter Isaacson, o apresenta como sendo gay, da mesma forma que Miquelangelo, Botticcelli e Donatello. Trata-se de uma informação que pouco acrescenta a obra do artista, mas que lança uma luz a respeito do imaginário sobre a sexualidade naqueles tempos.
Quando alcançou os vinte e cinco anos Leonardo da Vinci trabalhou em uma pintura, que até recentemente era considerada como a sua primeira obra feita por completo: "A Anunciação" (imagem mais acima). Trata-se de um dos temas mais comuns do Renascimento, o momento em que o anjo Gabriel revela à Virgem Maria que ela se tornaria a mãe de Jesus. A atribuição da autoria a Leonardo foi por muito tempo discutida em função de alguns "defeitos". O detalhamento exagerado do pano que recobre o colo da Virgem Maria e o fato deste se estender sobre um braço da cadeira, dando a impressão de que a Virgem têm "três pernas" (na imagem acima, estudo para o anjo Gabriel). A base do atril (onde o livro está apoiado) está mais próxima do observador do que de Maria e um de seus braços parece mais extenso do que o outro. Na verdade, trata-se do trabalho de um pintor ainda em formação. Com base no fato de termos o uso simultâneo da têmpera (a base de água, semelhante ao guache) e do óleo, existe a tendência atual de apontar ainda a mão de Verrocchio (que jamais usou tinta a base de óleo) no quadro.
Duas Madonas (pinturas cujo tema é a Virgem Maria com o menino Jesus) possivelmente pintadas nessa época, chegaram até nós: "Madona e a criança com flores" ou "Madona Benois" e a "Madona do cravo" ou "Madona de Munique" (acima, as duas obras respectivamente de cima para baixo). Nas mesmas já podemos perceber duas das características mais importantes do Leonardo pintor. O forte contraste entre luz e sombra, conhecido como chiaroscuro, a diluição das linhas e dos contornos por meio do sfumato, como nas paisagens de fundo, as quais são envolvidas por uma névoa tênue que desfaz as demarcações, exatamente como percebemos na realidade.
A representação do Menino Jesus demonstra que Leonardo da Vinci tinha feito desenhos de observação de bebês. Aliás, na própria família Leonardo pode encontrar tais modelos, pois Ser Piero, finalmente, tornou-se pai de dois filhos em seu terceiro casamento, entre os anos de 1475 e 1476. Até então, os bebês costumavam ser representados por outros artistas como adultos em tamanho menor (acima, estudos de Leonardo com o tema a Virgem e o Menino).
O retrato de Ginevra de' Benci é uma amostra do que estava por vir em relação ao Leonardo da Vinci pintor. Trata-se de sua primeira obra não religiosa. A jovem do retrato, filha de um rico banqueiro de Florença, pertencia a uma família aristocrática. O marido de Ginevra, Luigi Nicolini, era do ramo da tecelagem, ou seja, um endinheirado em busca de prestígio social. O pai de Leonardo, por sua vez, prestara serviços à família Benci e talvez tenha ajudado o filho a obter a encomenda. Mas, há outra história. O embaixador de Veneza em Florença, Bernardo Bembo nutriria uma paixão platônica pela jovem e teria, em função disso, requisitado um quadro da amada a fim de ter o seu rosto por perto. Originalmente foram pintadas as mãos de Ginevra, mas essa parte da tela foi cortada. Um estudo de mãos de Leonardo nos revela a intenção de incluir as mesmas no quadro (acima, o quadro e o estudo feito pelo artista). Atrás de Ginevra estão os ramos de junípero, que em italiano é ginepro, uma referência ao nome da retratada. O quadro reflete uma representação psicológica, com um certo ar de tristeza na jovem, que era doente e não teve filhos. Trata-se da única tela de Leonardo da Vinci que se encontra na América (na National Gallery de Washington).
Muitos trabalhos de Leonardo da Vinci ficaram incompletos porque o artista tentava aperfeiçoa-los ao longo do tempo. Parece ser esse o caso de "São Jerônimo" (imagem mais acima), o qual, pode ter sido realizado em duas etapas, em 1480 e 1510 e talvez estivesse apoiado em seus estudos posteriores de anatomia e na dissecação de cadáveres feitos durante a sua primeira estada em Milão (detalhe acima). Não se sabe quem encomendou a obra, mas sabemos como o trabalho foi encontrado depois de mais de trezentos anos. No começo do século XIX, o Cardeal Fesch, tio de Napoleão Bonaparte, descobriu em um antiquário de Roma um armário, que tinha como revestimento interno o tecido da tela com a obra, porém sem a cabeça. O Cardeal questionou onde a mesma poderia estar e acabou por encontrá-la, após meses de procura, em uma sapataria que a tinha pregada na parede e então, finalmente, as partes puderam ser remontadas. Além dos detalhes do pescoço e as costelas salientes do santo, temos também a figura do leão, o qual, segundo Serge Bramle, Leonardo desenhou ao vivo. De acordo com a tradição cristã, depois do santo ter retirado um espinho da pata do animal, o leão passou a conviver com São Jerônimo, que redigiu a versão latina da Bíblia (a Vulgata).
A fama de não entregar as obras, o episódio da sodomia e o pouco crédito que tinha no entorno de Lourenço, o Magnífico, muito provavelmente contribuíram para que Leonardo da Vinci resolvesse deixar a sua Toscana natal e a cidade de Florença. Na verdade, Lourenço de Médici fazia poucas encomendas a artistas, embora tenha promovido o jovem escultor Miquelangelo. As letras parecem te-lo atraído mais e por isso, gostava de estar em meio aos poetas e letrados. Como vimos, Leonardo não teve a formação superior e não sabia latim. Embora levasse em consideração os clássicos da Antiguidade, o jovem fixou os seus olhos na observação da natureza e dela buscava a inspiração para os seus estudos e trabalhos.
Leonardo da Vinci chegou em 1482 a Milão, na Lombardia (norte da Itália) com a idade de trinta anos, como uma espécie de diplomata cultural. A cidade tinha 125 mil habitantes, bem maior do que Florença e era governada por uma corte comandada por Ludovico Sforza, também chamado de "O Mouro" (na imagem acima, o seu retrato de perfil feito por um artista desconhecido). Sim, aquele que visitou Florença na companhia do irmão mais velho (que era o duque de Milão) em 1471. Milão era uma cidade-Estado de tipo feudal, inicialmente comandada pela família Visconti e depois pelos Sforza. Ao contrário de Florença, Milão não dispunha de muitos artistas, embora tivesse nas proximidades uma universidade, a de Pávia, fundada em 1361, com advogados, filósofos, médicos e matemáticos. Na cidade lombarda, Leonardo viveu os momentos mais férteis de sua vida em termos de criação e estudos. O rascunho de uma carta de Leonardo dirigida a Ludovico, o Mouro chegou até nós. Na mesma, o mestre florentino oferece os seus serviços como engenheiro militar, dizendo-se capaz de projetar as armas mais variadas e ao final, no décimo item, afirma que "em tempos de paz" poderia se equiparar a qualquer outro em arquitetura, escultura e em pintura. E acrescenta estar em condições de trabalhar no acalentado projeto do Mouro, uma estátua equestre (cavaleiro montado a cavalo) que deveria homenagear o seu pai, Francesco Sforza.
Pelo que nos informa Walter Isaacson, apenas um dos projetos militares de Leonardo saiu do papel: o sistema de rodete. O mesmo era um dispositivo que produzia faísca a fim de detonar a pólvora contida em um mosquete ou em uma arma portátil. Nenhuma das demais armas imaginadas por Leonardo da Vinci seria utilizada por Ludovico, até porque o governante de Milão não se envolveu em nenhum conflito militar sério até a invasão francesa de 1499, que pôs fim ao seu governo (acima, projeto feito por Leonardo, de uma máquina de assalto a uma muralha inimiga).
Por incrível que pareça, não foi como arquiteto ou engenheiro militar que Leonardo da Vinci fez a sua entrada na corte milanesa, mas sim como produtor de espetáculos. Tal atividade envolvia vários conhecimentos que atraiam a atenção de Leonardo: cenografia, música, figurinos, coreografia, alegorias e engenhocas que produzissem algum efeito para a plateia. Um desses espetáculos foi uma performance conhecida como "A Festa do Paraíso". No meio da apresentação a cortina subiu e revelou uma abóboda celestial no formato de um ovo pela metade. Tochas simbolizaram as estrelas e ao fundo os signos do zodíaco apareciam iluminados. Atores interpretaram os planetas por meio de movimentos, cada um em sua órbita. A mecânica empregada nas peças e espetáculos interessava a Leonardo da Vinci tanto quanto a parte artística, pois para o mestre florentino eram conhecimentos atrelados.
O desenho de caricaturas, que na época eram conhecidas por grotescos (imagens acima), também serviam para entreter os convidados da corte. Leonardo tinha o costume de percorrer ruas, comércio, tavernas para encontrar ou descobrir rostos exóticos e inclui-los em seus trabalhos.
Em Milão, Leonardo da Vinci ficou conhecido por sua simpatia e inteligência, uma pessoa agradável de se conversar e também gentil. Apesar de vegetariano, em suas listas de compras aparece a carne, que era consumida pelos outros residentes de sua casa, sendo o mais conhecido deles o filho de um camponês pobre chamado Gian Giacomo Caprotti, apelidado de Salai, que significava "diabinho" (acima, perfil de Salai desenhado por Leonardo). A data em que o garoto foi morar com o florentino ficou anotada (em 1490), quando Leonardo tinha 38 anos e o garoto dez. Salai tornou-se assistente, copista e talvez, seu amante, segundo nos informa Walter Isaacson. O garoto fez jus ao apelido recebido, pois Leonardo deixou anotações esporádicas citando que Salai se comportava de forma inadequada na mesa de refeições (era glutão), que roubava o seu dinheiro e o de seus convidados. Apesar disso, Leonardo continuou mantendo o rapaz, que o acompanhou quase até o final de sua vida e foi contemplado no testamento do florentino.
Em 1487, Leonardo da Vinci participou de um concurso promovido pelas autoridades de Milão, para o projeto de um zimbório (parte mais alta e exterior da cúpula de uma igreja) destinado a catedral de Milão, que já tinha cem anos, sendo a oportunidade para o florentino apresentar-se também como arquiteto. Embora não tivesse saído vencedor, Leonardo da Vinci teve a oportunidade de trabalhar com dois dos maiores nomes da arquitetura de seu tempo: Donato Bramante (futuro arquiteto da catedral de São Pedro em Roma) e Francesco di Giorgio Martini. Uma fértil amizade intelectual se estabeleceu entre Bramante e Leonardo. Anos depois, os dois trabalharam juntos na reforma do convento de Santa Maria delle Grazie em Milão e no acréscimo de um salão de refeições para os padres (Leonardo ficou encarregado de pintar a "Última Ceia" em uma das paredes).
Enquanto ainda trabalhavam no projeto do zimbório, Leonardo e Francesco di Giorgio fizeram uma viagem a Pavia (a cerca de quarenta quilômetros de Milão e, como já vimos, sede de uma importante universidade) onde uma catedral estava sendo erguida. Na biblioteca local existia um manuscrito do Tratado de Arquitetura de Vitrúvio, antigo oficial do exército romano ao tempo de Julio César (mais uma obra da Antiguidade Clássica redescoberta no Renascimento). O texto do arquiteto despertou o interesse dos dois no que dizia respeito à analogia (paralelo) entre o corpo humano e o universo, sendo o primeiro concebido como uma espécie de "mundo menor", pois as proporções do corpo humano e a sua simetria fundamentariam todas as demais construções do mundo. Por exemplo, um corpo com suas formas perfeitas, poderia ser a base do projeto de um templo ou igreja. Formas perfeitas? Pelos padrões de Vitrúvio, a medida ideal da distância entre o queixo e o topo da testa deveria ser correspondente a um décimo da altura do homem ou ainda, a distância entre os braços abertos do homem é igual a sua altura. O desenho do "Homem Vitruviano" de Leonardo da Vinci (imagem acima) procura demonstrar tais proporções. Seria o mesmo um autorretrato? Fica a dúvida. Como destaca mais uma vez Walter Isaacson, os estudos sobre Vitrúvio realizados por Leonardo e di Giorgio, demonstram a existência de uma colaboração intelectual entre os sábios na busca pelo conhecimento, durante a Renascença.
Quando se apresentou a Ludovico o Mouro, Leonardo ofereceu-se para realizar o grandioso monumento equestre de Francesco Sforza (pai de Ludovico). Da Vinci concebeu um cavalo de bronze com um cavaleiro montado, os quais deveriam pesar 75 toneladas, devendo se constituir no maior monumento equestre construído até então e superando os similares dos tempos da Roma Antiga. Contudo, o foco maior de Leonardo estava mais no cavalo do que no cavaleiro (como demonstram os estudos acima), o que fez com que o monumento ficasse conhecido apenas como Il Cavallo. Imediatamente, Leonardo começou a estudar esse animal, chegando mesmo a planejar um tratado sobre a anatomia dos cavalos. Ao mesmo tempo, projetou e idealizou estábulos mais limpos por meio de um sistema de comportas e pisos inclinados, a fim de facilitar a remoção do esterco.
Eis novamente o Leonardo da Vinci que se dispersa em estudos paralelos (na imagem acima, desenho de Leonardo com cavalo em movimento). A demora na elaboração do projeto deixou Ludovico preocupado e este chegou a requisitar a Florença artistas especializados nesse tipo de obra. Mas Leonardo conseguiu concluir uma versão em argila de tamanho natural, que foi exposta em novembro de 1493. Pelo que sabemos, o impacto foi grande e os elogios unânimes. Em seguida viria a parte mais complicada: fundir o monumento em bronze. Leonardo desejava fazê-lo em um único molde (com cavalo e cavaleiro), dentro do qual seria despejado o bronze derretido através de vários buracos, a fim de preencher internamente o gigantesco molde de maneira uniforme. Desta vez a conclusão da obra não dependeu só de Leonardo da Vinci. Em 1494, tropas francesas invadiram a Itália e o bronze destinado ao monumento equestre foi desviado para a fabricação de canhões. Cinco anos depois os franceses entraram em Milão e o que restava do modelo em argila do Il Cavallo foi destruído por arqueiros franceses que o utilizaram para a pratica de tiro ao alvo.
Alguns anos depois, Leonardo da Vinci ainda tentou encaminhar um projeto de monumento equestre, agora em homenagem ao militar francês Jean-Jacques Trivúlcio, o qual, certamente, teve conhecimento do modelo de argila feito por Leonardo para Ludovico, o Mouro (acima, esboços de Leonardo para esse novo projeto). Mais uma vez, as circunstâncias políticas o impediram de prosseguir nessa empreitada, pois os Sforza (sem Ludovico, o Mouro) recuperaram o controle de Milão em poder dos franceses.
Leonardo da Vinci intensificou os estudos sobre anatomia humana durante os seus anos em Milão. Segundo Leon Battista Alberti, o conhecimento da anatomia era fundamental para um artista fazer a representação correta de pessoas e animais. Os artistas de Florença já tinham tentado entender o funcionamento dos músculos do corpo humano, como por exemplo Antonio de Pollaiuolo, que teria realizado dissecações parciais de cadáveres com tal finalidade. Leonardo da Vinci travou contato com os médicos da Universidade de Pávia e conheceu os detalhes do processo de dissecação em 1489. Da Vinci vai muito além daquilo que era necessário para as suas pinturas e analisou em detalhes o crânio humano (como mostram os desenhos acima), inclusive com descrições da dentição (imagem acima). Como Leonardo buscava em suas pinturas mostrar as emoções das figuras através dos gestos, daí a tentativa de compreender o funcionamento do sistema nervoso e a relação deste com as impressões ópticas (da visão). Da Vinci acreditava que os impulsos visuais eram processados no cérebro e por meio do sistema nervoso alcançavam os músculos, determinando as atitudes e as emoções.
Uma das primeiras pinturas feitas por Leonardo da Vinci em Milão (se não for a primeira) é um quadro intitulado "O Músico" (imagem acima). A obra está incompleta (como se observa nas vestes do retratado) e para muitos estudiosos foi apenas parcialmente feita pelo mestre florentino, tendo também a participação de aprendizes. Acredita-se que a figura seja do músico Atalante Migliorotti que acompanhara Leonardo na viajem de Florença para Milão e que chamou a atenção do artista por sua beleza. Nesse trabalho, Leonardo da Vinci levou ao extremo o efeito do chiaroescuro (contraste entre claro e escuro).
Sem ter a formação acadêmica proporcionada por uma universidade, Leonardo da Vinci procurou suprir essa lacuna buscando experimentar e testar o que observava nos livros, num momento em que muitos intelectuais ainda se limitavam a apenas reproduzir o conteúdo dos mesmos. Isso não significava desprezo pelas teorias, ao contrário, ele desejava apenas comprovar empiricamente as mesmas. Aliás como faziam os estudiosos e cientistas do mundo islâmico. Leonardo tornou a natureza e o próprio homem o centro de suas atenções e estudos. A partir disso, em muitas situações, Leonardo foi além das próprias teorias e vislumbrou um horizonte de conhecimentos, muitos dos quais ainda se mostravam pouco aplicáveis ao momento em que vivia, daí afirmar-se que estava à frente de seu tempo. A sua passagem por Milão ainda nos revelará muito do Leonardo da Vinci artista e cientista. Mas, isso fica para a segunda e última parte desta postagem...
Para ler:
O livro escrito por Walter Isaacson intitulado Leonardo da Vinci (Rio de Janeiro: editora Intrínseca, 2017) propõe novas abordagens e traz informações atualizadas a respeito desta figura de grande destaque no Renascimento Cultural. Isaacson procura desmistificar a aura de "gênio" que foi imposta ao artista e cientista, mostrando que muitas de suas observações e descobertas foram fruto do contato com outros intelectuais, de muitas leituras, do ambiente favorável à troca de informações que já existia na época e claro, do esforço pessoal do próprio Leonardo, que se não foi o marco zero do conhecimento moderno (e será que alguém mais poderia ser?), deu uma contribuição fundamental para o seu avanço. Teve erros e acertos, não publicou os seus textos e conclusões, deixando muita coisa para futuras observações de outros estudiosos. O livro de Isaacson deve servir de base para um filme sobre o personagem a ser estrelado por outro Leonardo, o Di Caprio. Pelo menos é o que foi anunciado no início de 2018...
Crédito das imagens:
Pálio, livro de matemática comercial, Cristo e São Tomé de Verrocchio e bucchi de la Verità em Veneza: Renascença. Biblioteca de História Universal Life. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1970, páginas 155, 55, 52 e 36 respectivamente.
Busto de Lourenço de Médici por Verrocchio: National Gallery of Washington, cartão postal (acervo do autor).
Detalhe do autorretrato de Leonardo, condottieri, estudo de pano para A Anunciação, as duas Madonas, estudo de bebês, retrato de Ginevra de' Benci, estudo de mãos, A Adoração dos Magos, detalhe de A Adoração dos Magos, São Jerônimo, grupo de grotescos, estudo de cavalos (fundo azulado), O Homem Vitruviano, projeto de monumento para o comandante Trivúlcio e O Músico: Leonardo de Walter Pater. Editora Círculo do Livro, 1977.
Desenho com grotesco de perfil, de crânios, projeto de máquina para assaltar muralhas: https://www.rct.uk/
Aldeia (atual cidade) de Vinci, retrato de Verrocchio, O Batismo de Cristo, Anunciação, estátua de David de Verrocchio e retrato de Ludovico, o Mouro: Wikipédia.
Perfil de idoso e de Salai e perfil de Salai: http://www.drawingsofleonardo.org
Florença em 1480, primeiro desenho conhecido de Leonardo, estudo de anatomia, carro-ceifador, besta gigante e estudo para o monumento Sforza: Leonardo da Vinci de Walter Isaacson, Editora Intrínseca, 2017, páginas 41, 68, 435, 121 e 188 respectivamente.
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