sábado, 21 de novembro de 2015

Imagens Históricas 18: a Princesa Isabel e a Lei Áurea



A libertação dos escravos: 13 de maio de 1888. Nesse dia tivemos a assinatura da conhecida lei Áurea pela princesa Isabel, como mostra a foto acima, tirada diante do Paço Imperial no Rio de Janeiro e tendo a regente do trono (o imperador D. Pedro II encontrava-se na Europa para tratamento de saúde) na sacada do palácio, aclamada pela multidão, no mesmo dia da assinatura da famosa lei. Todos nós poderíamos imaginar que os problemas da população afrodescendente do Brasil estavam solucionados. Claro, deixar de ser escravo, de ser considerado uma simples mercadoria e sim um indivíduo livre, representou um avanço. Mas, um avanço que necessitava seguir adiante na promoção dessa massa populacional e da sua plena integração à sociedade brasileira, ou seja, que a mesma alcançasse plena cidadania. Isso está demorando para ocorrer, uma vez que, quase quatro séculos de escravidão deixaram sequelas. Uma população de ex-escravos que permaneceu ainda submetida ao controle dos fazendeiros na condição de arrendatários ou trabalhadores rurais. A outra opção, poderia ser ir para as cidades maiores, como Rio de Janeiro, Recife e Salvador, vivendo em condições miseráveis e dando origem às famosas favelas. O racismo e o preconceito social também ficaram arraigados em nossa sociedade, às vezes de forma pouco perceptível. 
Mas, vamos lembrar que a escravidão, naquele final de século XIX estava inserida dentro de um processo de transição para o trabalho livre. Desde 1850, com a lei Eusébio de Queiroz, que extinguia o tráfico de escravos da África para o Brasil, já se vislumbrava um futuro para o país sem o trabalho compulsório. A Inglaterra se engajava em uma campanha humanitária internacional contrária a permanência dessa ignóbil forma de trabalho e os Estados Unidos se dividiam em uma sangrenta guerra civil, entre outras razões, pela questão da manutenção ou não da escravidão. Em 1864, o presidente norte-americano Abraham Lincoln determinou a abolição do trabalho escravo, inclusive como forma de enfraquecer os Estados Confederados na Guerra de Secessão (1861-1865). 
Pois bem, na história brasileira, como nos lembra o historiador José Honório Rodrigues, em seu livro "Conciliação e Reforma no Brasil: um desafio histórico-cultural" de 1965, as mudanças se processaram mais como transições (ou conciliações) do que por rupturas violentas. Basta lembrar como ocorreu a nossa independência em 1822, promovida pelo próprio filho do rei de Portugal D. Pedro I (1822), o fim da monarquia (1889), a queda da Primeira República (1930) e da ditadura de Getúlio Vargas (1945). Eu ainda acrescentaria, dentro do raciocínio do grande historiador, as negociações que colocaram fim à ditadura militar e a aceitação pelos generais de um presidente civil, desde que fosse o moderado Tancredo Neves, em 1985. Tais conciliações eram realizadas tendo em vista a atender (muitas vezes, parecer atender) o desejo por mudanças, mas sem prejudicar as elites econômicas e os seus interesses.


Voltemos ao caso da escravidão. Antes da Lei Áurea, uma série de medidas paliativas haviam sido tomadas para atender aos abolicionistas e, ao mesmo tempo, não desagradar os grandes fazendeiros que ainda necessitavam dos escravos (na foto acima, de Marc Ferrez, escravos em um cafezal na província do Rio de janeiro, em 1882). Por exemplo, a Lei do Ventre Livre de 1871, que, em tese, garantia a liberdade do escravo recém-nascido, mas na condição de que este continuasse sob os cuidados do dono da mãe até atingir a maioridade. Que tal a Lei do Sexagenário (ou Saraiva Cotegipe) de 1885, que determinava a liberdade dos escravos com mais de 60 anos, em uma época em que a expectativa de vida da população era baixíssima, sobretudo da escrava. Como se dizia na época, eram leis "para inglês ver".


Ao mesmo tempo, muitos fazendeiros, sobretudo os cafeicultores de São Paulo, já se antecipavam ao futuro e começavam a recorrer ao imigrante europeu como alternativa ao escravo africano. O primeiro a fazer isso foi o senador Nicolau de Campos Vergueiro, proprietário da fazenda Ibicaba, na região de Limeira, interior de São Paulo, que em 1847, trouxe alemães e suiços para trabalharem em sua propriedade. Na época em que a Lei Áurea foi assinada (na foto acima, a princesa Isabel, ainda jovem, em foto sem data), a presença dos imigrantes no Brasil já era um fato irreversível e o trabalho livre no campo uma realidade, em que pesem o péssimo tratamento reservado aos italianos, portugueses e espanhóis, quase como se fossem mesmo escravos.


O mais incrível de tudo é que, mesmo tendo o fim da escravidão como fato consumado, quando a Lei Aúrea surgiu (na imagem acima, o decreto assinado pela princesa Isabel), muitos fazendeiros se sentiram prejudicados e reclamaram uma indenização do governo imperial pela perda dos cativos. Muitos historiadores apontam esse descontentamento como um fator que ajudou na queda de D. Pedro II e da monarquia, exatamente no ano seguinte ao fim da escravidão, em 1889. Claro que isso não explica, por si só, o fim do império. Inclusive a assinatura da Lei Áurea era uma forma do regime monárquico buscar mais prestígio diante do avanço do movimento republicano.  
A imagem histórica de hoje foi extraída do livro "Protestos e Passeatas: a construção da democracia", da Coleção Folha Fotos Antigas do Brasil (2012), volume 13, página 13 (que coincidência, para lembrar o dia 13 de maio).
Crédito das demais imagens:
Escravos em um cafezal na província do Rio de Janeiro: O Café: uma moeda forte para o país. Coleção Folha Fotos Antigas do Brasil. Editora Folha de S. Paulo, 2012, vol. 16, pag. 23. 
Foto da princesa Isabel ainda jovem: coleção Brasiliana Fotográfica
http://brasilianafotografica.bn.br/
Foto do decreto da lei Áurea: Coleção Grandes Personagens da Nossa História. Abril Cultural, 1969. 






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