domingo, 27 de setembro de 2020

Imagens Históricas 50: Silvio Santos



Neste ano de 2020, comemoramos os 70 anos da televisão brasileira, um feito notável se levarmos em consideração os parcos recursos que as emissoras pioneiras tinham disponíveis. Por outro lado, a criatividade dos profissionais e artistas deram um rosto próprio a essa mídia em nosso país. Infelizmente, nem todos estão sendo lembrados e muitas dessas emissoras ficaram esquecidas. Sem a menor dúvida mereciam uma instituição ou um museu que guardasse e preservasse essa memória, a exemplo do existente em Nova Iorque nos Estados Unidos, ao qual este que vos escreve teve a oportunidade de visitar. O primeiro passo nessa direção foi dado com a Pró-TV ou Associação dos Pioneiros, Profissionais e Incentivadores da Televisão Brasileira, fundada em 21 de agosto de 1995, que mantém uma página muito interessante na internet. 
A Imagem Histórica de hoje não é propriamente da televisão, mas sim do rádio. Porém, na mesma temos a presença de um profissional que fez história nos dois veículos de comunicação, Senor Abravanel, mais conhecido pelo seu nome artístico de Silvio Santos. Profissional brilhante, talentoso e também polêmico, no que se refere às suas posições políticas (ou suposta neutralidade), que lhe granjeou a simpatia do governo militar e lhe permitiu adquirir a concessão de seus canais de televisão, na década de 1970. Antes de comentarmos a respeito de Silvio Santos, vamos fazer justiça e identificar todos os que aparecem na foto acima. Da direita para a esquerda, em pé: Silvio Santos, Luiza Duarte, Alceu Teixeira, Marita de Luca, Paulo Rogério, Reinaldo Barroso. Sentados da esquerda para a direita: José Russo, Hélio de Alencar e José Rosa. Infelizmente é possível que a identificação dos "sentados" não esteja correta em relação à ordem. Todos eram locutores da Rádio Nacional de São Paulo, emissora pertencente às Organizações Victor Costa (OVC), também proprietária da TV Paulista Canal 5, onde Silvio Santos fez a sua estreia na televisão.


De acordo com o jornalista Alberto Dines, em seu livro "O Baú de Abravanel" (Cia. das Letras, 1990), a família de Sílvio Santos é originária da cidade de Salônica, na costa leste da Grécia. De origem judaica, a linhagem dos Abravanéis remonta ao início do século XIV, ainda na Idade Média e sabe-se, com absoluta certeza, que os ancestrais do "homem sorriso" viviam na Península Ibérica, primeiro em Portugal e depois, no Reino de Castela (embrião da futura Espanha). 



Aliás, a família (acima, brasão do clã Abravanel) teve um personagem famoso em termos históricos  e que foi ancestral direto de Silvio Santos pelo lado paterno, Dom Isaac Abravanel (1437-1508), estadista, rabino, comentador da Torá (equivalente ao Antigo Testamento), financista (banqueiro) e muito próximo aos reis católicos Fernando e Isabel, tendo antes servido aos reis de Portugal. Para se ter uma ideia, ele esteve presente na tomada de Granada em 1492, na qual os espanhóis ocuparam o último território em poder dos muçulmanos na Europa. É de pleno conhecimento que os banqueiros judeus tiveram participação no financiamento da armada de Cristovão Colombo, que naquele mesmo ano de 1492 alcançou a América. 



Ainda em 1492, Dom Isaac Abravanel estabeleceu-se no Reino de Nápoles (sul da Itália) após as perseguições aos judeus promovidas na Espanha pela Inquisição e por se recusar a converter-se ao catolicismo. Boa parte de sua fortuna foi confiscada (acima, medalhão comemorativo dos 500 anos de nascimento de Dom Isaac Abravanel). Na Itália, teve uma vida relativamente tranquila até falecer na cidade de Veneza, em 1508.
Outro ancestral do "homem do Baú", Daniel Abravanel Dormido, esteve em Olinda, Pernambuco, durante a Invasão Holandesa ao Brasil, que durou de 1630 a 1654. Enquanto estiveram no Brasil, os holandeses estabeleceram um convívio pacífico entre católicos, calvinistas e judeus. Aliás, em Recife situou-se a primeira sinagoga (templo judaico) das Américas. Como grande parte dos judeus sefarditas (de origem ibérica), os Abravanéis viveram uma dispersão pela Europa Oriental, sobretudo Grécia e Turquia, entre os séculos XVI e XIX. 


A família de Silvio Santos (na foto acima, em 1965 na TV Paulista) chegou ao Rio de Janeiro no início do século XX. O futuro apresentador e "animador" começou a sua carreira como locutor das balsas que faziam a travessia Rio-Niterói, no início da década de 1950 (ainda não existia a ponte). Quando uma das balsas foi para o estaleiro e ficou encostada, Silvio decidiu tentar a sorte em São Paulo em 1954, onde foi aprovado em um teste para a Rádio Nacional da OVC. 



Nesta emissora conheceu Manoel de Nóbrega (1913-1976), de quem se tornou sócio no Baú da Felicidade (na foto acima, Manoel de Nóbrega em meados da década de 1950). Na versão oficial, Nóbrega deu a Silvio Santos carta branca para administrar o negócio, que era deficitário. No Baú da Felicidade, o indivíduo (ou freguês, como o próprio Silvio Santos chamava) adquiria um carnê para concorrer a prêmios, desde que estivesse em dia com as prestações do tal carnê. Ao final do ano, caso o freguês (a) não ganhasse nenhum prêmio, o saldo acumulado era convertido em crédito para a compra de mercadorias nas lojas conveniadas, que depois passaram a ser do próprio Baú da Felicidade. Também pelas mãos de Nóbrega, Silvio Santos estreou em 1960 na TV Paulista Canal 5, ainda pertencente à OVC, com um show de prêmios intitulado "Vamos Brincar de Forca?". Há informações (em revistas da época) de que sua estreia teria sido no programa Hit Parade de 1958, como apresentador. 


De qualquer forma, em 1963, já tinha um programa aos domingos com duas horas de duração (acima Silvio Santos no início da década de 1960). Com o êxito do Baú e de seus outros negócios, Silvio Santos passou a comprar o horário dominical na TV Paulista, além de ter um programa no meio da semana na TV Tupi Canal 4 de São Paulo, que era concorrente da primeira. 


Em 1964, a TV Paulista foi adquirida pelas Organizações Roberto Marinho, para se tornar a TV Globo de São Paulo. Por ter o horário pago, Silvio Santos permaneceu na emissora com o seu Baú da Felicidade (na foto acima, Silvio Santos entrevista a cantora Ângela Maria em seu programa dominical, no ano de 1970). Os negócios do apresentador se expandiram, com uma concessionária da Volkswagen, uma Financeira, a Vimave (Vila Maria Veículos), a nova rede de lojas Tamakawi e até terras na Amazônia (para a pecuária), no sul do Pará, aproveitando os incentivos fiscais do Governo Militar para a ocupação da região. Em 1972, o seu contrato com a Globo estava expirando e temendo não renová-lo, adquiriu 50% das ações da TV Record para garantir a sua permanência na televisão. Mas a parceria acabou sendo renovada por mais quatro anos. 



De acordo com a versão oficial, em 1975, em pleno governo do General e Presidente Ernesto Geisel, Silvio Santos foi informado por seu amigo, o jornalista Moyses Weltmann, que o governo iria colocar em leilão o Canal 11 do Rio de Janeiro, extinto desde o fechamento da TV Rio. Silvio Santos apresentou um plano para entrar no leilão e obteve a concessão do Canal 11 (na foto acima, da esquerda para a direita, Silvio Santos, Luciano Calegari e o Ministro das Comunicações, Euclides Quandt de Oliveira). Com o nome de TV Studios Silvio Santos ou TVS, a nova emissora entrou no ar em 14 de maio de 1976. 



Nesse mesmo ano, Roberto Marinho passou a não aceitar que um integrante da Globo tivesse a sua própria emissora e não renovou mais com Silvio Santos (na foto acima, capas de revistas com Silvio Santos e Hebe Camargo, final da década de 1960). Após sair da TV Globo, os programas dominicais de Silvio Santos passaram a ser transmitidos pela TV Record e claro, pela TVS do Rio. 
Em 1980, foi decretada a falência da TV Tupi e no ano seguinte Silvio Santos recebeu a concessão da antiga emissora, dando origem à sua própria rede, a TVS, depois Sistema Brasileiro de Televisão ou SBT. Afirma-se que a amizade de Silvio Santos com a Dona Dulce Figueiredo, esposa do então General e Presidente da República João Baptista Figueiredo, teria facilitado tal aquisição. Talvez uma estratégia da Ditadura Militar, já no apagar das luzes, de não deixar o controle da mídia em poder de uma única família, as Organizações Roberto Marinho? Há ainda muito a ser escrito a respeito da forma como são concedidas as estações de rádio e televisão no Brasil e, principalmente, dos critérios para tais concessões. Não restam dúvidas de que a proximidade com os que estão no poder é um fator decisivo, mesmo que tal poder seja despótico e ditatorial. Outro ponto ainda controverso diz respeito às relações entre Silvio Santos e Carlos Alberto de Nóbrega, cuja amizade foi rompida em 1976. Alegava Carlos Alberto que o pai, Manoel de Nóbrega, havia sido enganado na sociedade estabelecida desde a época da criação do Baú da Felicidade. Em 1987, Silvio Santos se reconciliou com Carlos Alberto, levando-o para o SBT para apresentar "A Praça é Nossa", programa criado por seu pai em 1957 (com o nome de "A Praça da Alegria") e até hoje no ar. 
E a recente falência do Banco Panamericano também de propriedade das Organizações Silvio Santos? Bem, são assuntos complexos demais para tratarmos neste espaço tão reduzido. Como afirmamos antes, muita coisa ainda está por ser escrita. A Imagem Histórica mais acima foi extraída da revista Radiolândia, edição de 15.09.1956, página 48. Um detalhe curioso, a revista era de propriedade do senhor Roberto Marinho...
Crédito das imagens: 
Brasão da família Abravanel: Wikipédia.
Medalha com o perfil de Isaac Abravanel: 
https://www.abebooks.com/
Foto de Manoel de Nóbrega: Pnterest. 
Fotos de Silvio Santos em 1965: Revista Intervalo, 1965. 
Demais imagens: acervo do autor. 

2 comentários:

  1. É uma viagem muito interessante e curiosa sobre as comunicações e a televisão brasileira, sobretudo a esse famoso apresentador,é uma aula para os estudantes de comunicação da nova geração. Recomendo
    Parabéns ao blog.

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