Pois bem, uma dessas salas teve grande destaque em São Paulo: o cine Comodoro (na imagem acima, o anúncio da inauguração, em 1959). Em várias ocasiões, mesmo já no limiar de sua decadência, o Comodoro foi apontado como a melhor sala de cinema da capital paulista e, para muitos, do Brasil. Não tanto pela qualidade dos filmes que exibia, mas no que se referia aos quesitos técnicos, que o colocavam na condição de poder apresentar as grandes produções de Hollywood ou os chamados filmes épicos. A gigantesca tela em curva e o som estereofônico eram os grandes diferenciais do Comodoro em relação aos outros cinemas da capital paulista.
O cine Comodoro foi idealizado pelo empresário Paulo Sá Pinto (1912-1991), diretor-presidente das Empresas Cinematográficas Paulista e Sul, proprietária de outras salas importantes na capital paulista, como o já citado cine Marabá, além dos cines Ouro, República, Olido e Ritz. Sá Pinto (acima, em 1960, ao ser condecorado com a medalha Marechal Rondon) nasceu em Minas Gerais, mas se estabeleceu em São Paulo, onde entrou para o ramo das salas de espetáculos e cinemas. Posteriormente, expandiu os seus negócios para o sul do Brasil, nas cidades de Curitiba e Porto Alegre. O empresário chegou a ter o controle de 60 salas de cinema em sete capitais do país. Mas foi em São Paulo que a sua empresa adquiriu maior prestigio e ficou conhecida, quebrando a hegemonia de outro empresário do ramo, Francisco Serrador. Sempre entusiasmado com as novas técnicas cinematográficas vindas de Hollywood, foi por sua iniciativa que foi exibido o primeiro filme em cinemascope (tela panorâmica) no Brasil, "O Manto Sagrado" (The Robe, 1953), no cine República, em São Paulo. Nesta mesma sala, foi apresentado pela primeira vez o Terceira Dimensão (3D), também por iniciativa de Paulo Sá Pinto.
Ao conhecer em Nova Iorque o processo Cinerama, resolveu trazer a novidade para cá. Para exibir filmes nesse novo formato, foi construído o Comodoro (na foto acima, o edifício Lucerna, na avenida São João, recém concluído e ainda antes de receber o Cine Comodoro). A imprensa paulista afirmava que foi a primeira sala cinematográfica do mundo idealizada especialmente para o processo Cinerama.
Todo o projeto do cine Comodoro foi feito com a supervisão de técnicos norte-americanos, que vieram ao Brasil especialmente para esse trabalho, uma vez que o cinema teria de obedecer aos padrões estabelecidos para a exibição em Cinerama (na foto acima, a instalação da tela do Comodoro, onde podem ser observados os alto-falantes frontais). Até hoje, os projetos do cine Comodoro se encontram arquivados nos Estados Unidos.
A película escolhida para a inauguração foi "Isto é Cinerama" (This is Cinerama), lançada em 1952 em Nova Iorque. Esse filme, na verdade um documentário, foi produzido especialmente para promover o processo de exibição da nova técnica (na foto acima, anúncio do filme, com imagem da fachada do cine Comodoro).
Exatamente por isso, para entendermos o aparecimento desse cinema, que marcou a memória de muitos paulistanos (na imagem acima, a sala do Comodoro na época da inauguração), é necessário lembrarmos da técnica do Cinerama, surgida no início da década de 1950, a qual, juntamente com o 3D, o Cinemascope, o Panavision e o som estereofônico, procuravam capacitar o cinema para enfrentar o seu grande inimigo naquele momento: a televisão. Era necessário encontrar formas de fazer a classe média estadunidense continuar a frequentar as salas de espetáculos, uma vez que o formato tradicional de exibição dos filmes não se mostrava mais tão atraente.
No mês anterior à inauguração do Comodoro, Harry Goldberg, diretor-publicitário da Stanley Warner Cinerama Corporation, organização produtora e distribuidora das películas em Cinerama, veio ao Brasil para promover o lançamento. Em um coquetel para a imprensa, ele descreveu a evolução e o funcionamento do Cinerama. O desenvolvimento desse sistema levou aproximadamente 15 anos, culminando em 1952 com a apresentação do já citado filme "Isto é Cinerama". Fred Waller (1896-1954) foi o inventor do processo, que também teve a participação do engenheiro de som Hazard Reeves, que aperfeiçoou a distribuição dos alto-falantes nas salas de cinema. Além desses dois, o produtor Lowell Thomas foi o responsável pela realização dos primeiros filmes pelo novo processo.
A palavra "cinerama" (acima, o logo do sistema) é o resultado da fusão dos termos cinema e panorama, em função da boa visualização proporcionada por essa tecnologia, para imagens em grandes dimensões. Ao contrário do processo em Terceira Dimensão, que dá a impressão de que a pessoa ou objeto focalizado sai da tela, indo de encontro ao espectador, no Cinerama é o espectador que é "absorvido" pela imagem. Por exemplo, na apresentação de uma viagem de montanha-russa, quem está assistindo tem a sensação visual de estar no próprio carrinho.
Fred Waller desenvolveu uma forma de expandir a tela de cinema convencional, dando a ilusão da profundidade, fazendo com que o público se tornasse parte do espetáculo. Na imagem projetada no cinema comum, apenas o centro da cena é visualizado. O que estiver fora desse enquadramento só poderia ser visto se a câmera promovesse a sua focalização. Waller criou uma câmera com 3 lentes objetivas (ou câmera trifocal), as quais funcionavam com três rolos de filmes, um para cada lente. Cada uma delas cobria um terço dos 146 graus formados na tela que receberia a projeção. Todas as cenas eram filmadas nessa câmera trifocal. Ao mesmo tempo, tudo era acompanhado por um sistema de som adaptado especialmente para a filmagem nesse processo. Microfones eram espalhados por toda a área que a câmera cobria e o som gravado em sua própria fonte de origem. Dessa forma, Waller substituiu o sistema tradicional, onde um único microfone recebia todos os sons.
Em 1939, Fred Waller conheceu o engenheiro de som Hazard Reeves na Feira Mundial de Nova Iorque e o trabalho dos dois levou ao aperfeiçoamento definitivo do Cinerama, na parte visual e sonora. Na sala de cinema, alto-falantes espalhados por todo o recinto, criavam a impressão do som vir de todos os lados, como ocorre na realidade. Era um sistema de som multidimensional. Em 1949, a técnica já estava plenamente desenvolvida, combinando som e imagem em grandes dimensões. Em 1953, Fred Waller recebeu um Oscar Honorário da Academia de Cinema de Hollywood, pelos avanços nas técnicas de fotografia e projeção que culminaram no Cinerama.
Dessa forma, a exibição sob o processo Cinerama exigia salas e equipamentos especiais. A começar pela tela, que tinha 146 graus de curvatura, 23 metros de comprimento por 8 metros de altura (na foto acima, a tela com o formato para Cinerama, do cine Comodoro). Até mesmo a confecção do "tecido" que a recobria obedecia a especificações detalhadas, a fim de evitar o excesso de luz em determinados pontos (como nos cantos e nas laterais) e também a distorção da imagem.
Três projetores para películas de 35 milímetros, funcionando de forma simultânea, exibiam o filme. Cada projetor cobria um terço da tela, sendo que as três partes formavam a cena completa. O som de "alta fidelidade" ou estereofônico com sete canais era reproduzido por 10 alto-falantes distribuídos em cada lado da sala, inclusive atrás da tela. Além dos indivíduos que cuidavam dos projetores, um operador de som ficava na extremidade direita da sala e um técnico de imagens trabalhava no centro inferior da tela (como no desenho mostrado acima).
Contudo, a técnica do Cinerama apresentava imperfeições na junção das três imagens na tela (na foto acima, as linhas verticais das emendas, separando as três partes que eram projetadas) e no sincronismo dos aparelhos de projeção. Outro aspecto negativo, apontado pelos críticos de cinema, referia-se ao fato de que a técnica era na verdade uma forma de entretenimento visual, adequada para cenas panorâmicas com grandes espaços ou paisagens. Para o cinema de arte ou para cenas que exigiam o foco da câmera, o sistema se mostrava inadequado. Tanto isso foi um fato, que a maior parte dos filmes realizados nesse processo eram, na verdade, documentários. Apenas um filme de longa-metragem e com história foi produzido no processo Cinerama original: "A Conquista do Oeste" (How the West Was Won, 1962). O curioso é que a fita não foi exibida no Comodoro.
Além da primeira produção, "Isto é Cinerama", vieram depois "Cinerama Holiday" (1955), "As Sete Maravilhas do Mundo" (Seven Wonders of the World, 1956), "Cinerama Em Busca do Paraíso" (Search for Paradise, 1957), "Aventuras nos Mares do Sul" (South Seas Adventures, 1958) e "Velas ao Vento" (Windjanmer, 1958). Todos esses filmes produzidos em Cinerama foram exibidos e reprisados no Comodoro, entre 1960 e 1965 (como no anúncio acima, de "As Sete Maravilhas do Mundo", de 1960).
Quando da sua abertura em 1959, a sala foi apresentada como uma grande novidade na capital paulista e no Brasil (acima, uma rara foto do interior do Cine Comodoro, no ano de inauguração). Basta lembrar que, até aquele momento, apenas duas cidades da América do Sul dispunham de Cineramas: Caracas (na Venezuela) e Buenos Aires (na Argentina). No interior do cinema, a capacidade de público era de 1.020 lugares, sendo 200 na platéia superior ou balcão nobre, que teriam preços mais elevados. Diariamente, seriam três sessões, às 15, 19 e 22 horas. A grande novidade era de que os ingressos eram numerados e poderiam ser comprados pelo correio, uma tentativa de atrair o público de outros lugares que estavam em visita a São Paulo.
O crítico de cinema do jornal "Correio Paulistano", Walter Rocha, escreveu na semana anterior à abertura do Comodoro, que o Cinerama poderia se tornar uma atração para a cidade de São Paulo (acima, outra imagem raríssima da fachada original do Comodoro). Apesar da capital paulista não ter os mesmos atrativos do Rio de Janeiro, Rocha afirmou que "a mão do homem se encarregou de suprir" as suas "deficiências naturais" e as salas de cinema eram exemplos disso. Desde o Olido e o Rivoli, tidos como "cinemas de alto luxo" até o cine República, que o empresário Paulo Sá Costa insistia em ser o cinema possuidor da maior tela do mundo (e depois demolido para a construção do metrô). A cidade poderia agora se equiparar às grandes capitais do mundo e caberiam algumas iniciativas para tornar o Cine Comodoro uma verdadeira atração turística, como convidar prefeitos do interior e motoristas de táxi para uma sessão gratuita, a fim de divulgar esse cinema aos seus respectivos públicos.
Contudo, o Cinerama deixou de ser uma novidade e os filmes voltados apenas para a diversão visual se tornaram repetitivos. Além disso, as películas nesse formato não podiam ser exibidas em todas as salas de cinema, limitando a distribuição. A fim de adequar o processo aos filmes com enredo, passou-se a utilizar a película de 70 milímetros de largura, garantindo a exibição em grandes telas, sem a necessidade dos três projetores e permitindo, em grande parte, a exibição das cenas panorâmicas. Em função disso, o Comodoro passou por uma adaptação e reabriu em 1966, exibindo filmes nesse novo formato.
Muitas superproduções, como "Os Dez Mandamentos", "E o Vento Levou", "Ben-Hur", "Lawrence da Arábia", entre outros, puderam ser exibidos em tela grande e em cópias novas no formato 70 mm. O cine Comodoro chegou ao seu auge nas décadas de 1970 e 1980, e ainda conheceu uma outra novidade técnica vinda de Hollywood, embora também passageira: o Sensurround. O Comodoro dispunha de uma aparelhagem sonora de grande capacidade e chegou até a receber concertos musicais ao vivo. É o que veremos na segunda parte desta postagem...
Para saber mais:
Grande parte das informações contidas nesta postagem foram obtidas em consultas aos arquivos digitais dos jornais da época: Correio Paulistano, O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Folha da Manhã. Além dos jornais, recorremos também ao excelente blog Salas de Cinema de São Paulo: salasdecinemadesp.blogspot.com.br.
Última atualização: 1 de setembro de 2020.
Crédito das Imagens:
Foto do edifício Lucerna: Pinterest.
Fotos da inauguração do cine Comodoro, do empresário Paulo Sá Pinto, da montagem da tela, da platéia, anúncio do filme "Isto é Cinerama" e da tela em curva foram tiradas do blog Salas de Cinema de São Paulo.
Anúncio do filme "Cinerama Holiday": jornal Folha de S. Paulo, 20.12.1960, caderno Ilustrada, pag. 14.
Anúncio da abertura para breve do cine Comodoro: jornal Correio Paulistano do dia 7.08.1959, pág. 6 (2º caderno).
Anúncio da inauguração do Comodoro, com "Isto é Cinerama": Folha da Manhã, 26.07.1959, pag. 6.
Anúncio do filme "As Sete Maravilhas do Mundo": jornal Folha de S. Paulo, 20.03.1960, caderno Ilustrada, p. 8.
Ilustração mostrando a exibição dos três projetores: agência Estado (acervo do jornal O Estado de S. Paulo).
Foto das imperfeições no Cinerama: compiscentro.info/blog/csc/bad-cinerama.html.
Foto do interior da fachada e do cine Comodoro durante a exibição de um filme : revista A Cigarra, edição de novembro de 1959, páginas 48 e 49.
Foto do logo Cinerama: capa da trilha sonora do filme "2001: Uma Odisséia no Espaço".
A palavra "cinerama" (acima, o logo do sistema) é o resultado da fusão dos termos cinema e panorama, em função da boa visualização proporcionada por essa tecnologia, para imagens em grandes dimensões. Ao contrário do processo em Terceira Dimensão, que dá a impressão de que a pessoa ou objeto focalizado sai da tela, indo de encontro ao espectador, no Cinerama é o espectador que é "absorvido" pela imagem. Por exemplo, na apresentação de uma viagem de montanha-russa, quem está assistindo tem a sensação visual de estar no próprio carrinho.
Fred Waller desenvolveu uma forma de expandir a tela de cinema convencional, dando a ilusão da profundidade, fazendo com que o público se tornasse parte do espetáculo. Na imagem projetada no cinema comum, apenas o centro da cena é visualizado. O que estiver fora desse enquadramento só poderia ser visto se a câmera promovesse a sua focalização. Waller criou uma câmera com 3 lentes objetivas (ou câmera trifocal), as quais funcionavam com três rolos de filmes, um para cada lente. Cada uma delas cobria um terço dos 146 graus formados na tela que receberia a projeção. Todas as cenas eram filmadas nessa câmera trifocal. Ao mesmo tempo, tudo era acompanhado por um sistema de som adaptado especialmente para a filmagem nesse processo. Microfones eram espalhados por toda a área que a câmera cobria e o som gravado em sua própria fonte de origem. Dessa forma, Waller substituiu o sistema tradicional, onde um único microfone recebia todos os sons.
Em 1939, Fred Waller conheceu o engenheiro de som Hazard Reeves na Feira Mundial de Nova Iorque e o trabalho dos dois levou ao aperfeiçoamento definitivo do Cinerama, na parte visual e sonora. Na sala de cinema, alto-falantes espalhados por todo o recinto, criavam a impressão do som vir de todos os lados, como ocorre na realidade. Era um sistema de som multidimensional. Em 1949, a técnica já estava plenamente desenvolvida, combinando som e imagem em grandes dimensões. Em 1953, Fred Waller recebeu um Oscar Honorário da Academia de Cinema de Hollywood, pelos avanços nas técnicas de fotografia e projeção que culminaram no Cinerama.
Dessa forma, a exibição sob o processo Cinerama exigia salas e equipamentos especiais. A começar pela tela, que tinha 146 graus de curvatura, 23 metros de comprimento por 8 metros de altura (na foto acima, a tela com o formato para Cinerama, do cine Comodoro). Até mesmo a confecção do "tecido" que a recobria obedecia a especificações detalhadas, a fim de evitar o excesso de luz em determinados pontos (como nos cantos e nas laterais) e também a distorção da imagem.
Três projetores para películas de 35 milímetros, funcionando de forma simultânea, exibiam o filme. Cada projetor cobria um terço da tela, sendo que as três partes formavam a cena completa. O som de "alta fidelidade" ou estereofônico com sete canais era reproduzido por 10 alto-falantes distribuídos em cada lado da sala, inclusive atrás da tela. Além dos indivíduos que cuidavam dos projetores, um operador de som ficava na extremidade direita da sala e um técnico de imagens trabalhava no centro inferior da tela (como no desenho mostrado acima).
Contudo, a técnica do Cinerama apresentava imperfeições na junção das três imagens na tela (na foto acima, as linhas verticais das emendas, separando as três partes que eram projetadas) e no sincronismo dos aparelhos de projeção. Outro aspecto negativo, apontado pelos críticos de cinema, referia-se ao fato de que a técnica era na verdade uma forma de entretenimento visual, adequada para cenas panorâmicas com grandes espaços ou paisagens. Para o cinema de arte ou para cenas que exigiam o foco da câmera, o sistema se mostrava inadequado. Tanto isso foi um fato, que a maior parte dos filmes realizados nesse processo eram, na verdade, documentários. Apenas um filme de longa-metragem e com história foi produzido no processo Cinerama original: "A Conquista do Oeste" (How the West Was Won, 1962). O curioso é que a fita não foi exibida no Comodoro.
Além da primeira produção, "Isto é Cinerama", vieram depois "Cinerama Holiday" (1955), "As Sete Maravilhas do Mundo" (Seven Wonders of the World, 1956), "Cinerama Em Busca do Paraíso" (Search for Paradise, 1957), "Aventuras nos Mares do Sul" (South Seas Adventures, 1958) e "Velas ao Vento" (Windjanmer, 1958). Todos esses filmes produzidos em Cinerama foram exibidos e reprisados no Comodoro, entre 1960 e 1965 (como no anúncio acima, de "As Sete Maravilhas do Mundo", de 1960).
Quando da sua abertura em 1959, a sala foi apresentada como uma grande novidade na capital paulista e no Brasil (acima, uma rara foto do interior do Cine Comodoro, no ano de inauguração). Basta lembrar que, até aquele momento, apenas duas cidades da América do Sul dispunham de Cineramas: Caracas (na Venezuela) e Buenos Aires (na Argentina). No interior do cinema, a capacidade de público era de 1.020 lugares, sendo 200 na platéia superior ou balcão nobre, que teriam preços mais elevados. Diariamente, seriam três sessões, às 15, 19 e 22 horas. A grande novidade era de que os ingressos eram numerados e poderiam ser comprados pelo correio, uma tentativa de atrair o público de outros lugares que estavam em visita a São Paulo.
O crítico de cinema do jornal "Correio Paulistano", Walter Rocha, escreveu na semana anterior à abertura do Comodoro, que o Cinerama poderia se tornar uma atração para a cidade de São Paulo (acima, outra imagem raríssima da fachada original do Comodoro). Apesar da capital paulista não ter os mesmos atrativos do Rio de Janeiro, Rocha afirmou que "a mão do homem se encarregou de suprir" as suas "deficiências naturais" e as salas de cinema eram exemplos disso. Desde o Olido e o Rivoli, tidos como "cinemas de alto luxo" até o cine República, que o empresário Paulo Sá Costa insistia em ser o cinema possuidor da maior tela do mundo (e depois demolido para a construção do metrô). A cidade poderia agora se equiparar às grandes capitais do mundo e caberiam algumas iniciativas para tornar o Cine Comodoro uma verdadeira atração turística, como convidar prefeitos do interior e motoristas de táxi para uma sessão gratuita, a fim de divulgar esse cinema aos seus respectivos públicos.
Contudo, o Cinerama deixou de ser uma novidade e os filmes voltados apenas para a diversão visual se tornaram repetitivos. Além disso, as películas nesse formato não podiam ser exibidas em todas as salas de cinema, limitando a distribuição. A fim de adequar o processo aos filmes com enredo, passou-se a utilizar a película de 70 milímetros de largura, garantindo a exibição em grandes telas, sem a necessidade dos três projetores e permitindo, em grande parte, a exibição das cenas panorâmicas. Em função disso, o Comodoro passou por uma adaptação e reabriu em 1966, exibindo filmes nesse novo formato.
Muitas superproduções, como "Os Dez Mandamentos", "E o Vento Levou", "Ben-Hur", "Lawrence da Arábia", entre outros, puderam ser exibidos em tela grande e em cópias novas no formato 70 mm. O cine Comodoro chegou ao seu auge nas décadas de 1970 e 1980, e ainda conheceu uma outra novidade técnica vinda de Hollywood, embora também passageira: o Sensurround. O Comodoro dispunha de uma aparelhagem sonora de grande capacidade e chegou até a receber concertos musicais ao vivo. É o que veremos na segunda parte desta postagem...
Para saber mais:
Grande parte das informações contidas nesta postagem foram obtidas em consultas aos arquivos digitais dos jornais da época: Correio Paulistano, O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Folha da Manhã. Além dos jornais, recorremos também ao excelente blog Salas de Cinema de São Paulo: salasdecinemadesp.blogspot.com.br.
Última atualização: 1 de setembro de 2020.
Crédito das Imagens:
Foto do edifício Lucerna: Pinterest.
Fotos da inauguração do cine Comodoro, do empresário Paulo Sá Pinto, da montagem da tela, da platéia, anúncio do filme "Isto é Cinerama" e da tela em curva foram tiradas do blog Salas de Cinema de São Paulo.
Anúncio do filme "Cinerama Holiday": jornal Folha de S. Paulo, 20.12.1960, caderno Ilustrada, pag. 14.
Anúncio da abertura para breve do cine Comodoro: jornal Correio Paulistano do dia 7.08.1959, pág. 6 (2º caderno).
Anúncio da inauguração do Comodoro, com "Isto é Cinerama": Folha da Manhã, 26.07.1959, pag. 6.
Anúncio do filme "As Sete Maravilhas do Mundo": jornal Folha de S. Paulo, 20.03.1960, caderno Ilustrada, p. 8.
Ilustração mostrando a exibição dos três projetores: agência Estado (acervo do jornal O Estado de S. Paulo).
Foto das imperfeições no Cinerama: compiscentro.info/blog/csc/bad-cinerama.html.
Foto do interior da fachada e do cine Comodoro durante a exibição de um filme : revista A Cigarra, edição de novembro de 1959, páginas 48 e 49.
Foto do logo Cinerama: capa da trilha sonora do filme "2001: Uma Odisséia no Espaço".