As mulheres da foto acima atuaram como franc0-atiradoras no Exército Soviético e foram responsáveis pela morte de 775 integrantes do Exército Alemão. O leitor pode considerar isso algo um tanto quanto bárbaro e cruel. Mas imagine que a guerra estava entrando dentro de casa. Não havia outra alternativa a não ser lutar e defender o país contra inimigos, os quais inclusive, se consideravam racialmente superiores e praticavam o extermínio puro e simples dos demais.
Em 8 de março lembramos o Dia Internacional da Mulher. É comum e plenamente justificado fazer a analogia da mulher contemporânea como uma guerreira, uma vez que as mesmas enfrentam obstáculos no cotidiano e no mundo do trabalho comparáveis aos de um campo de batalha. Infelizmente, as mulheres já viveram situações de maior participação social, exercendo atividades tidas como exclusivas dos homens. Um exemplo disso foi durante a Segunda Guerra Mundial ou Grande Guerra Patriótica (como os russos a chamam até hoje) e no pior momento da mesma em termos de perdas humanas: a invasão alemã à União Soviética. Sem o gigantesco esforço coletivo da população, os soviéticos não teriam conseguido repelir o ataque nazista, uma vez que Hitler havia assinado um acordo de não-agressão com Stalin pouco antes da guerra iniciar em setembro de 1939. De qualquer forma, a invasão por parte do Terceiro Reich (Império Alemão) era esperada para ocorrer em algum momento do conflito.
A grande mortandade, lembrando que a União Soviética foi o país que mais vítimas teve na Segunda Guerra Mundial (superando a marca dos 20 milhões) gerou escassez de mão de obra para as fábricas ao lado da necessidade de recrutar tropas para as linhas de combate, a fim de garantir a sustentação da defesa. Aproximadamente 1 milhão de mulheres foram arregimentadas nas Forças Armadas e destas 2 mil exerceram a atividade de franco-atiradoras, sendo responsáveis por mais de 12 mil mortes confirmadas, na grande maioria de oficiais do Reichswehr (Exército Alemão). Os comandantes soviéticos acreditavam que as mulheres tendiam a ser mais pacientes e cuidadosas, condições ideais para tal tipo de atividade. Como afirmou um oficial do Exército Vermelho: "a mão de uma mulher é mais sensível do que a de um homem. Portanto, quando uma mulher está atirando, seu dedo indicador puxa o gatilho de forma mais suave e propositalmente."
As oficiais do Exercito Vermelho também receberam treinamento para adquirir habilidades de infiltração, vigilância, reconhecimento, camuflagem e localização dos alvos. Por falar em alvos, estes eram preferencialmente os comandantes e os oficiais alemães experientes, pois eram mais difíceis de serem substituídos. Por outro lado, à medida em que essas atiradoras começaram a demonstrar exito em seus ataques, a resposta alemã também tornou-se mais violenta, inclusive com eventuais prisioneiras que eram capturadas. Para se ter uma ideia dessa reação, das 2 mil oficiais atiradoras recrutadas para esse serviço, apenas 500 sobreviveram ao final da guerra.
Uma dessas franco-atiradoras foi a ucraniana Lyudmila Pavlichenko (foto acima), sendo considerada a mais bem sucedida. Na verdade, Lyudmila já tinha experiência anterior na atividade em um clube de tiro na cidade de Kiev e ainda trabalhou como operária em fábrica de armamentos. Em 1937 entrou na Universidade de Kiev para estudar história e estava no quarto ano quando teve início o ataque nazista, tendo em seguida se alistado como voluntária. Ao ser integrada ao 25º Exército Vermelho na divisão de infantaria, Lyudmila teve a opção de trabalhar como enfermeira, mas escolheu atuar diretamente nas frentes de combate. Em função de seus conhecimentos de tiro tornou-se uma das 2 mil atiradoras de elite do sexo feminino do Exército Vermelho. Atuou na região do Mar Negro, em Odessa (onde contabilizou 187 mortes) e na Península da Crimeia (porto de Sebastopol). Em maio de 1942 foi condecorada por ter eliminado 257 alemães, entre soldados e oficiais. Até ser ferida em combate em junho de 1942, Lyudmila Pavlichenko foi responsável pela eliminação de 309 alemães em território soviético. A atiradora costumava atuar adiante de sua unidade, acompanhada de um observador, chegando a permanecer imóvel por até 18 horas seguidas a fim de obter o momento preciso para o tiro!
Após sofrer ferimentos, Lyudmila Pavlichenko (foto acima carregando uma arma) permaneceu em recuperação por mais de um mês e, em seguida, foi enviada para a América do Norte para realizar visitas em nome do governo soviético. Naquele momento, Estados Unidos e União Soviética somavam esforços para deter o avanço dos nazistas na Europa e dos japoneses na Ásia. Lyudmila tornou-se uma garota-propaganda do regime comunista em território ianque, sendo a primeira cidadã soviética a ser recebida pelo presidente dos Estados Unidos Franklin Roosevelt e pela primeira-dama Eleanor Roosevelt. A conhecida atiradora ainda realizou viagens pelo interior da América relatando a sua experiência, ganhando de presente uma pistola da marca Colt semi-automática e um rifle Winchester, armas muito conhecidas nos tempos da conquista do Velho Oeste. De volta à União Soviética, Lyudmila foi promovida a major, passou a treinar outras atiradoras (e atiradores também) e nunca mais precisou entrar em combate.
Em 1943 foi agraciada com a Estrela de Ouro de Heroína da União Soviética, tendo a sua imagem estampada em um selo comemorativo (imagem acima). Após o fim da guerra, Lyudmila Pavlichenko retomou os seus estudos na Universidade de Kiev, formando-se historiadora. Entre 1945 e 1953 ainda atuou como assistente de pesquisa da Marinha Soviética. Lyudmila faleceu em 1974, aos 58 anos de idade e está enterrada em Moscou.
Conta-se que durante a visita aos Estados Unidos, Eleanor Roosevelt teria perguntado a Lyudmila Pavlichenko (na foto acima de 1942) quantos homens ela matou na guerra e esta respondeu:
- Não eram homens, eram fascistas!
Crédito das imagens:
Foto das franco-atiradoras juntas: Pinterest
Fotos de Lyudmila Pavlichenko:
http://darozhistoriamilitar.blogspot.com.br/2016/03/dia-internacional-da-mulher-historia-de.html
Foto do selo e da atiradora em 1942: Wikipédia.